Malditos descobrimentos…(um país embriagado com mitos de grandeza)
O jornal Público de hoje traz uma "notícia" sobre um historiador brasileiro que nega a existência da chamada "Escola de Sagres". Embora o artigo até seja esclarecedor, indicando nomeadamente outros historiadores portugueses que defendem a mesma tese, é muito interessante olhar para a caixa de comentários onde são manifestadas opiniões de cariz xenófobo sobre o Brasil, causadas pela embriaguez que reina em Portugal com as chamadas "glórias do passado". Trata-se dum problema não exclusivamente português, mas antes de muitos países que não sabem viver com o seu passado de modo sério e desapaixonado. A Grécia, por exemplo, por ter sido considerada o "berço da democracia", sofre do mesmo irrealismo histórico, que sobrevaloriza um passado glorioso para melhor esquecer um presente sem glória e sobretudo manter-se tolhida, sem capacidade reformista para melhorar esse presente. Outro exemplo é a Sérvia (e outros países dos Balcâs) que, como dizia Churchill, "sofre de ter demasiada História para a sua pequena Geografia"). O próprio Brasil tem muito deste irrealismo "português" sobre a sua própria História, oscilando entre fases de euforia ("Deus é brasileiro") e de desânimo ("o Brasil não presta"), embora nas últimas duas décadas tenha finalmente beneficiado de governos verdadeiramente reformistas (2 mandatos de Fernando Henrique Cardoso e 2 de Lula da Silva), que colocaram o país no mapa do mundo com um estatuto à altura da sua dimensão e importância.
Os mitos dos Descobrimentos, criados pelos historiadores românticos do século XIX, reforçados com a República (1910-1928) e elevados à condição de "verdades indiscutíveis" durante o Estado Novo (1928-1974), ainda hoje têm grande influência na opinião pública portuguesa. É uma influência perniciosa, que nos dificulta a vida, pois prejudica a nossa capacidade de actuar com ponderação para levar a cabo as reformas tão necessárias ao país.
O problema dos mitos é que prejudicam as outras áreas políticas que ficam obscurecidas, mas prejudicam também a própria área que supostamente promovem. Não se entende por que motivo um país turístico como somos parece ser incapaz de explorar com inteligência aquela paisagem extraordinária que é o promontório de Sagres. Tudo o que se tem dito sobre aquele sítio (incluindo os tais "mitos") deveria estar exposto ali, sem estragar a paisagem.
Sei que há na administração pública e nos meios académicos da História pessoas que lutam por soluções interessantes para preservar e promover Sagres, mas infelizmente não sei se serão ouvidas. É que em Portugal dá sempre mais votos ser irrealista e clamar à mesa de café contra os "traidores à Pátria"….
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