via Sopas de Pedra de A. M. Galopim de Carvalho em 31/05/09
.Mas para mim, que vivi as minhas infância e adolescência nos anos 30 e 40 do século que passou, e para os homens e mulheres da minha geração, pirolito era um popular refrigerante, uma gasosa do tipo Seven-Up, contida numa garrafa de vidro muito especial. Especial, em primeiro lugar, porque não tinha rótulo nem a tradicional carica das gasosas e cervejas desse tempo e dos dias de hoje. Em sua substituição tinha um berlinde. Empurrado de baixo para cima, sob a pressão do gás, esta perfeita esfera de vidro colava-se a uma anilha de borracha junto ao gargalo, vedando eficazmente a dita garrafa. Especial era, ainda, a forma deste vasilhame, fabricado num vidro transparente esverdeado, testemunhando um certo grau de impureza da areia usada como matéria-prima. Impureza que os industriais vidreiros sabem ser devida a um certo teor de ferro que caracteriza alguns minerais habitualmente associados ao quartzo, o mineral francamente dominante das nossas areias. Essa forma distinguia-se por um estrangulamento abaixo do gargalo que impedia o berlinde de cair para o fundo, ficando ali a badalar, numa sonoridade vítrea, inesquecível, sempre que a bandeávamos, num gesto que nunca deixávamos de repetir.
-Ainda na vidreira, com o vidro quente e ainda deformável, o artífice fazia-lhe o dito estrangulamento e introduzindo sobre ele o berlinde. Só depois afunilava o gargalo, deixando prisioneira aquela bolinha tilintante. Depois, na fábrica do refrigerante, a gasosa era introduzida na garrafa virada de boca para baixo e, uma vez concluído o enchimento, o berlinde caía, colando-se à anilha, por efeito da pressão do gás. Podia-se, finalmente, endireitar a garrafa, metê-la numa das doze células das muitas grades de madeira, em que viajavam a caminho dos estabelecimentos onde eram servidas a rapazes, raparigas e mulheres. Os homens bebiam cerveja.
-Sempre que uma destas garrafas se quebrava, aproveitava-se o berlinde para jogar um jogo praticado no chão, em terra batida. Um jogo que vinha de gerações anteriores, hoje quase esquecido e que entreteve, horas e horas, anos a fio, os rapazes da minha geração.
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