Em homenagem a Gabriel Buchmann, pela sua namorada Cristina Reis. Um documento de muita e sentida emoção...Rui Moio
Agradecer significa demonstrar gratidão, palavra advinda do passivo da palavra latina gratus, num sentido de ter sido agradado ou sentir-se deliciado. Quero dizer que nunca na minha vida compreendi e vivenciei tão fortemente esse sentimento. Parece um absurdo, pois passo a dor mais profunda, jamais sentida dantes – a de ter perdido um grande amor. Mas na verdade não o perdi, não o perdemos. Quem conviveu com Gabriel, trocou momentos com ele e quem soube da história após o desfecho trágico da realização de seu sonho, ganhou muito. Ganhamos a oportunidade de conhecer seu espírito jovem e caridoso, sua vontade de melhorar o mundo, sua gana pelo conhecimento, seu amor ao próximo. Ganhamos a sensação de ser a pessoa mais interessante no presente pleno, o do aqui e agora, pois Gabriel paralisava o tempo e o ambiente externo quando conversava com alguém, prestando atenção total. Aliás, ele era o melhor exemplo do "sê inteiro", de Pessoa. Além de íntegro de caráter.
Gabriel estava sempre se deslumbrando, como uma criança a ver as coisas pela primeira vez. Esta faculdade era uma das que mais me admiravam. E, enquanto se encantava com as cores, a natureza e os seres humanos, seguia encantando a todos, mostrando que bonito é o mundo em que estamos. Era também um ser fluído, camaleão. Não lhe bastava observar, precisava participar. Queria saber como é o trabalho de cada um, presenciando ao máximo a divisão do trabalho, como estudamos em economia – capinar a terra, cerzir um tapete, dirigir caminhões, escrever artigos sobre educação. Precisava sentir na pele a temperatura da água, mirar a partir do topo a visão das montanhas e das árvores, provar o colorido das roupas dos diferentes povos, dançar todos os ritmos. Saiu pelo mundo em busca de sabedoria, a mais importante delas, a que traz as respostas para os questionamentos e impulsos internos. Respostas que se desvelavam enquanto lidava com as diferentes realidades dos povos, viu a pobreza sob vários ângulos e também a riqueza da alma humana.
Meu querido era lindo. De alma pura, olhar verdadeiro. E será para sempre nos nossos corações. Como disse no velório, aprendi com ele a plenitude do amor e a gostar de mim mesma. Sinto-me grata à vida e a Deus por tê-lo amado plenamente, aceitando também seus defeitos. Amei sua essência, compreendi a verdade do meu próprio lado, a ilusão que fiz sobre quem ele era – como fazemos com tudo e todos que vemos. E quando a minha ilusão se desfez, continuei firme ao seu lado. E, por incrível que pareça, amando-o mais ainda.
Sinto-me grata pela onda de amor e solidariedade que se ergueu na busca de Gabriel, sinto-me grata igualmente por todas as pessoas envolvidas nessa história. Fico contente por cada palavra de amor, cada olhar afetuoso, cada gesto nobre. Neste período duro de buscas, as pessoas mostraram seu lado mais belo, mais amoroso. Sou grata à comoção de cada brasileiro e de cada estrangeiro. Agradeço as doações, a todos que trabalharam nas buscas, a imprensa – por ter lhe dado a oportunidade de divulgar seus ideais e aumentar a corrente de orações. E que corrente maravilhosa! Nunca esquecerei o empenho e dedicação dos malauienses, canadenses, argentinos, brasileiros e demais que escalaram o monte Mulanje para achar o Gab. Graças a Deus fomos bem sucedidos, ele retornou à sua terra e à sua família, recebendo as despedidas e homenagens merecidas. Agradeço o imenso carinho da família e dos amigos – meus e do Gabriel -, que vão no meu coração avante pela vida inteira. Em especial, obrigada meu irmão, André, por estar ao meu lado no Malauí, sem você eu não teria suportado a dor da má notícia.
Num dos últimos dias em que estive com Gabriel, gritamos como loucos para as cataratas Vitória, na Zâmbia, um estrondoso OBRIGADA a Deus por estar ali, juntos, diante de tanta beleza (em anexo, uma foto desse dia). Sentíamo-nos plenos de amor e felicidade. E assim quero seguir sentindo. A tal onda gigante de amor despertou uma força poderosa dentro de mim, que não imaginava possuir. Uma força para vencer essa dor e sentir-me feliz por estar viva, tocando em frente com fé, como na música que cantarolávamos juntos....
Beijos para todos,
Titi"
Tocando em Frente
Composição: Almir Sater e Renato Teixeira
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