via Sopas de Pedra by A. M. Galopim de Carvalho on 11/22/09
CALDO DE FARINHA, assim se chamava uma beberragem que se tomava quente e em substituição do leite, ao fim do serão, antes do deitar, ou pela manhã, a acompanhar torradas com toucinho cozido sobrado do jantar da véspera. Leite nem sempre havia e quem o trazia era o tio Afonso que, ao fim da tarde, de porta em porta, o ia vendendo aos litros, meios litros e metades de meio litro, consoante o número de filhos e as posses de cada um. A higiene em todo o processo, desde o produtor à distribuição ambulante, era a possível nesse tempo e, daí, a necessidade de ferver o leite. Havia, mesmo, uma espécie de grande púcaro de esmalte, chamado fervedor, para levar o leite ao lume e deixá-lo, aí, levantar fervura.
- Já foi por fora! – Gritava a mãe, arreliada, que, tendo saído da cozinha, onde vigiava a dita fervura, ia, a correr, fazer qualquer coisa e, quando voltava, via o leite em espuma a transbordar e a apagar as brasas de carvão da fornalha (o nosso fogão desse tempo), e a encher o ar do odor a leite queimado. Uma experiência que morreu com a pasteurização industrial deste bem, hoje, felizmente, generalizado.
Não era raro juntarem-se, à nossa porta, o leiteiro, com o seu grande caldeirão de lata e as medidas penduradas numa mão, e o Feliciano das "sobras", que vinha diariamente recolher, porta a porta, os restos de cozinha com que ia engordando um porquito, importante suplemento na sua economia familiar. Nos recipientes, que trazia, destapados, num carrinho de mão, as sobras fediam de azedas e vinham sempre acompanhadas de enxames de moscas que, em menos de um ai, se atiravam aos escorridos de leite nas medidas do tio Afonso e aos pingos que caíssem, ali à porta, nas pedras da calçada. Foi neste quadro e neste tempo que o caldo de farinha fez parte das nossas vidas.
Em água fria, a minha mãe diluía a quantidade necessária de farinha de trigo, da mais fina, isto é, a que fora joeirada na peneira de malha mais apertada. Esta mistura, a fazer de leite, ia ao lume, numa "chocolateira", aromatizada com uma casquinha de limão e uma colherzinha de banha para dar sustento. Antes do caldo levantar fervura, juntava-lhe o açúcar e ia-se mexendo sempre com uma colher de pau até engrossar na medida do pretendido. Em algumas casas acrescentava-se pó de cacau à farinha, preparando assim o chocolate e, daí, o chamarmos chocolateiras às vulgaríssimas cafeteiras. Uma variante muito perfumada deste caldo era preparada com a farinha levemente torrada, o que era conseguido ao lume sobre um tabuleiro de lata, mexendo sempre com a colher para que ficasse uniformemente alourada.
- Já foi por fora! – Gritava a mãe, arreliada, que, tendo saído da cozinha, onde vigiava a dita fervura, ia, a correr, fazer qualquer coisa e, quando voltava, via o leite em espuma a transbordar e a apagar as brasas de carvão da fornalha (o nosso fogão desse tempo), e a encher o ar do odor a leite queimado. Uma experiência que morreu com a pasteurização industrial deste bem, hoje, felizmente, generalizado.
Não era raro juntarem-se, à nossa porta, o leiteiro, com o seu grande caldeirão de lata e as medidas penduradas numa mão, e o Feliciano das "sobras", que vinha diariamente recolher, porta a porta, os restos de cozinha com que ia engordando um porquito, importante suplemento na sua economia familiar. Nos recipientes, que trazia, destapados, num carrinho de mão, as sobras fediam de azedas e vinham sempre acompanhadas de enxames de moscas que, em menos de um ai, se atiravam aos escorridos de leite nas medidas do tio Afonso e aos pingos que caíssem, ali à porta, nas pedras da calçada. Foi neste quadro e neste tempo que o caldo de farinha fez parte das nossas vidas.
Em água fria, a minha mãe diluía a quantidade necessária de farinha de trigo, da mais fina, isto é, a que fora joeirada na peneira de malha mais apertada. Esta mistura, a fazer de leite, ia ao lume, numa "chocolateira", aromatizada com uma casquinha de limão e uma colherzinha de banha para dar sustento. Antes do caldo levantar fervura, juntava-lhe o açúcar e ia-se mexendo sempre com uma colher de pau até engrossar na medida do pretendido. Em algumas casas acrescentava-se pó de cacau à farinha, preparando assim o chocolate e, daí, o chamarmos chocolateiras às vulgaríssimas cafeteiras. Uma variante muito perfumada deste caldo era preparada com a farinha levemente torrada, o que era conseguido ao lume sobre um tabuleiro de lata, mexendo sempre com a colher para que ficasse uniformemente alourada.
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