domingo, 4 de janeiro de 2009

A grande fornalha

A grande fornalha

via Sopas de Pedra de A. M. Galopim de Carvalho em 29/12/08
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RENÉ DESCARTES, filósofo francês do séc.XVII, via na Terra um pequeno Sol abortado, que arrefeceu e solidificou em superfície, mas mantendo o fogo central. Na mesma época, o jesuíta Athanasius Kircher defendia a existência de um fogo no centro da Terra, que comunicava com reservatórios que, por sua vez, alimentavam os vulcões. Esta ideia de um fogo central, que deu suporte à imagem do Inferno, fora já anunciada, no século V, a.C., pelo filósofo grego Empédocles. No séc. XVIII, Buffon, o grande naturalista francês, seguiu as ideias de Descartes e defendia que era esse calor central que gerava os magmas como os que se viam brotar dos vulcões.
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Ao contrário do seu satélite, a Terra conserva, em profundidade, calor suficiente para lhe assegurar a maior parte do seu dinamismo interno. Sendo mais pequena, a Lua arrefeceu a ponto de nela ter cessado toda a actividade magmática, cujas últimas manifestações são as de um vulcanismo extinto há cerca de 3000 milhões de anos. A Terra funciona como uma imensa fornalha, sendo o seu calor interno o somatório do calor que lhe ficou da sua formação como planeta, mais o calor gerado pela radioactividade de certos elementos radioactivos, ao longo dessa enormidade de tempo.
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Especialmente concentrado e intenso no núcleo, este calor alimenta a convecção térmica da espessa capa que o envolve, a que foi dado o nome de manto, considerado o motor do alastramento das bacias oceânicas e consequente deriva dos continentes, da origem e elevação das cadeias de montanhas, dos sismos e do vulcanismo.
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A utilização do calor interno do planeta fez desenvolver um capítulo da Geologia – a Geotermia – que, além de uma componente teórica, fundamental, se reveste de uma outra de carácter prático, visando o aproveitamento desta inesgotável fonte de energia, dita geotérmica, com vista à sua transformação em energia eléctrica ou como utilização para aquecimento na indústria ou em habitações. As explorações geotérmicas localizam-se, sobretudo, na vizinhança de vulcões activos ou adormecidos e sobre câmaras magmáticas prestes a desencadear vulcanismo, onde as rochas do subsolo estão bastante quentes. Na Ilha de S. Miguel, Açores, funcionam, actualmente, duas centrais geotérmicas associadas ao vulcão do Fogo, que abastecem cerca de 40% das necessidades da ilha em energia eléctrica. Não relacionada com o vulcanismo, mas apenas com o calor normal no interior da crosta, as fontes termais de Chaves e de S. Pedro do Sul, com águas emergentes a 70ºC, são dois exemplos de aproveitamento desta grande fornalha que é o interior da Terra.

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