via Sopas de Pedra de A. M. Galopim de Carvalho em 05/04/09
CORRIA O ANO DA GRAÇA de 1959, há precisamente meio século, era eu aluno finalista e estagiário, como auxiliar de investigação, no Centro de Geologia Pura e Aplicada, dirigido pelo professor Carlos Teixeira, quando, para grande alegria minha, o director me incluiu na representação portuguesa ao Congresso Luso-Espanhol para o Progresso das Ciências, a decorrer em Sevilha. Nessa altura eu tinha entre mãos o estudo sedimentológico de um conjunto de amostras dos depósitos areno-argilosos que colhera no decurso de uma excursão à Bacia do Mondego, na invejável companhia dos professores Pierre Birot e Orlando Ribeiro e do filho deste último, António, o meu colega e amigo de há meio século, nesse tempo ainda estudante, como eu. Esta excursão, guiada por estes dois mestres, pioneiros numa metodologia dos estudos geomorfológicos, substancialmente assente no cabal conhecimento dos materiais sedimentares resultantes da erosão do relevo, foi decisiva na escolha da linha de investigação que caracterizou o essencial da minha actividade profissional. Foi nesta linha que me iniciei no estudo sedimentológico dos referidos materiais e que, com base nele, preparei a minha primeira comunicação científica. Foi também a primeira vez que saí para o estrangeiro, tendo conhecido uma Espanha pobre, mais pobre do que nós, ao contrário dos dias de hoje. Os trabalhos do Congresso decorreram normalmente e dele apenas me lembro do quase incontrolável nervosismo que me dominou até ao momento em que o moderador me chamou para apresentar o que foi o meu primeiro trabalho científico.
.À margem do congresso ficou-me, bem gravado na memória, um episódio protagonizado por uma jovem assistente da nossa Faculdade, também ela congressista. Vivia-se uma época em que era frequente adquirir certos artigos espanhóis, trazidos por contrabandistas e chegados ao consumidor através de mecanismos que não interessa agora analisar. Um desses artigos era o Embrujo de Sevilla, apreciadíssimo perfume da Myrurgia, uma poderosa concorrente das grandes marcas francesas de então.
.Acontece que esta jovem não sabia que embrujo, em castelhano, quer dizer encantamento. Para ela, significava, pura e simplesmente, "embrulho". E foi com esta ideia em mente que entrou numa perfumaria, na Sierpes e, trocando, subsconscientemente, embrulho por cartucho, se dirigiu ao balcão e, com aquele à vontade dos portugueses que julgam saber falar castelhano, pediu, num "portunhol" que lhe pareceu adequado, um frasco de "Cartucho de Sevilha".
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Pela sonoridade da expressão pronunciada por esta portuguesa, a senhora que a atendeu não teve dúvida em perceber o que ela queria.
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- Embrujo de Sevilla, quiere usted decir!
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- É isso, desculpe – anuiu, descontraidamente, a nossa compatriota, que pagou e saiu satisfeita por ter comprado ali um bom perfume e a um preço muito mais em conta do que o que pagava em Lisboa.
- É isso, desculpe – anuiu, descontraidamente, a nossa compatriota, que pagou e saiu satisfeita por ter comprado ali um bom perfume e a um preço muito mais em conta do que o que pagava em Lisboa.
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