via sorumbático de noreply@blogger.com (A. M. Galopim de Carvalho) em 07/07/08
Por A. M. Galopim de CarvalhoO EXAME ORAL sempre foi, quanto a mim, o que melhor avalia o aluno. Nunca apreciei, nem enquanto aluno nem, mais tarde, como professor, o estilo de exame oral no qual o examinador fazia uma pergunta, bem concisa, e ficava, friamente, à espera da resposta que, ou não vinha ou era titubeada ou recitada, estereotipadamente, sem qualquer suporte reflexivo. Em quarenta anos de docência na Universidade de Lisboa, foram milhares os alunos que examinei. Nas provas escritas muitos eram, entre alunos e professores, os que preferiam os "testes à americana", com respostas imediatas, no estilo de colocar uma cruz numa casinha entre duas, três ou quatro à escolha. Não obstante a comodidade de classificar um tal tipo de prova, este não foi o meu modo de conceber os pontos de exame. Sempre preferi as questões proporcionando respostas de desenvolvimento. Permitem mais correcta avaliação da competência do aluno, não só na disciplina em causa, como na globalidade dos seus conhecimentos e respectiva maturidade intelectual. Não estamos a avaliar crianças, estamos a lidar com adultos.
Se é certo que esta modalidade de provas escritas tem vantagens no conjunto geral da avaliação, ela representa um esforço considerável por parte do avaliador. Deste esforço sobressai, com uma evidência e uma frequência que chegam a ser escandalosas, a má utilização da língua materna, a deficiente ortografia e a péssima caligrafia reveladas por um número preocupante dos nossos alunos, tudo fruto de uma orientação pedagógica ineficaz que, de há décadas, se instalou no nosso sistema de ensino. Ler dias a fio, dezenas e dezenas de provas escritas nestes moldes nacionais foi dos trabalhos mais confrangedores que me foi dado cumprir, como docente. Também por esta razão sempre me foi mais agradável e, até, repousante o exame oral. Via de regra, a maioria dos nossos alunos expressavam-se oralmente melhor do que escreviam.
Provas orais de dez minutos, de enfiada, «vai-te embora, venha o próximo», como fiz algumas, enquanto aluno, e nessas nem revelei (por sorte) a minha ignorância em algumas matérias, nem me foi dado demonstrar o interesse e o cuidado com que preparara outras. Comigo, na situação de examinador e em determinadas disciplinas, não se fazia prova escrita. Todo o aluno ia à oral e esta prova, rapidamente, se transformava numa conversa, "como as cerejas". Começava sempre por dissertar em torno de um qualquer assunto, dando ao aluno a oportunidade de entrar em diálogo. Nesta modalidade duas situações extremas e opostas podiam acontecer. Numa delas, a mais agradável, o aluno interrompia-me constantemente e a prova decorria com grande vivacidade sem nos darmos conta do tempo, atingindo-se, nestes casos, as máximas classificações. Na outra, a pior, quer do ponto de vista do examinando quer do meu, eu falava o tempo todo e ele, calado, ouvia, ouvia, na maior parte das vezes visivelmente interessado, até chegarmos a um ponto em que era inevitável convidá-lo a vir na próxima época, mas bem preparado.
Um dia, um aluno, daqueles que não frequentavam as aulas teóricas, porque trabalhavam, ao levantar-se da cadeira, no final de uma prova oral da qual saíra excluído e com plena consciência da justeza desse resultado, disse-me:
- Sabe, professor, vim à sorte, com uma certa inconsciência, é certo, a ver se calhava, mesmo que fosse um dez. A licenciatura permite-me subir na repartição. Para ser chefe de serviço tanto faz geologia como história ou filosofia. O que é preciso é ser doutor. Mas há uma coisa, - continuou - nesta meia hora de exame: aprendi a gostar desta matéria. Em Outubro, ou melhor, talvez para o ano, cá estarei.
E esteve. E ficou aprovado.
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