Compreende-se a razão de ser da paragem. Em certa medida, até Cabo Verde, a viagem atlântica não levanta grandes problemas. Depois de quase meio século de navegações naquela região, seguindo uma rota que, a partir da Europa, acompanha a costa e as ilhas, pode-se dizer que os portugueses se encontram em latitudes familiares. A rota usual - a da exploração dos rios da Guiné e das viagens costeiras mais meridionais - inflectia depois para nascente, a caminho da Mina. Fora, anos antes, a caminho do Atlântico Sul, a rota descobridora de um Diogo Cão e de um Bartolomeu Dias.
Mas agora, o itinerário marítimo é outro. Trata-se de, partindo de Cabo Verde, proceder às delicadas manobras que, em pleno oceano, vão conduzir a armada directamente ao extremo meridional do continente africano. Vão ser longas semanas de mar alto, sem ver terra. Um erro naquelas cruciais manobras, nessa estreita faixa do Atlântico Central, pode ser fatal para a expedição. Podem ser obrigados pelos alísios a regressar ao Atlântico Norte…, ou podem entrar na zona das calmarias que tantos problemas criou a Cristóvão Colombo na sua terceira viagem americana… ou, finalmente, podem ser apertados para os mares do interior do golfo da Guiné. Em certa medida, o segredo da rota do Atlântico Meridional, a porta do cabo da Boa Esperança está ao largo de Cabo Verde.
Por isso, Bartolomeu Dias, que acompanha a armada de Gama até essas manobras, uma vez realizadas, pode abandonar a frota, dirigindo-se à Mina. Como escreve João de Barros, depois «da partida da qual ilha, Bartolomeu Dias os acompanhou até se pôr no caminho da derrota para a Mina, Vasco da Gama na sua». E Damião de Góis afirma que, à saída da ilha de Santiago, a frota, «seguindo seu regimento», se dirige ao cabo da Boa Esperança. Com efeito, na rota portuguesa a caminho do Atlântico Sul, o mais difícil parece estar feito…
"Vasco da Gama - O Homem, A Viagem, A Época", Luís Adão da Fonseca, Edição do Comissariado da Exposição Mundial de Lisboa de 1998 e da Comissão de Coordenação da Região do Alentejo, 1997, pp. 112 e 113
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