Retomando a viagem de Vasco da Gama, recordo que, como disse, a 4 de Abril, a armada parte para Mombaça, onde chega três dias depois. Pelas informações dos pilotos mouros, os portugueses pensam ser essa a cidade onde existe uma população cristã. Embora com muita gente doente a bordo, os portugueses vivem a esperança de que - como se lê no texto do roteiro - «ao outro dia iríamos ouvir missa em terra com os cristãos, que nos diziam que aqui havia». Total desilusão. O relato das idas e vindas, entre os barcos e a cidade, revela o mundo de desconfianças que separa a população de Mombaça dos navegadores recém-chegados.
Assim, a 13 de Abril, partem de novo, desta vez a caminho de Melinde, onde chegam no dia seguinte, ao pôr do Sol. O bom acolhimento aí encontrado pelos portugueses contrasta com o que se passara na ilha de Moçambique e em Mombaça. É uma vila que se parece com Alcochete, escreve Álvaro Velho. O roteiro espraia-se, assim, em prolixas descrições, relatando o que aconteceu até ao dia 24, data da partida para a derradeira etapa que conduzirá Vasco da Gama até à costa ocidental da Índia.
Certamente que a forma positiva como os portugueses foram recebidos se deve fundamentalmente a dois tipos de circunstâncias.
Em primeiro lugar, os efeitos da própria forma como, nesse momento, está organizado o equilíbrio de poderes no Índico, nomeadamente na costa oriental africana. Aí, Melinde tem todo o interesse em, apoiando-se nos portugueses, se destacar das outras cidades-estados suaílis da região (Quíloa, Mombaça e Pate).
Em segundo lugar, depois do que se tinha passado na ilha de Moçambique e em Mombaça, certamente já se teria divulgado o poder de fogo da armada portuguesa. Como se lê no roteiro, os de Melinde «nunca ousaram de vir aos navios, porque estavam já avisados e sabiam que tomáramos uma barca com os mouros».
Vasco da Gama deve ter, nesse momento, uma única e fundamental preocupação: dada a fuga dos pilotos em Mombaça, o seu grande objectivo é o de arranjar localmente quem os substitua. Assim, no dia 16, através de um mouro velho que tinha sido capturado logo à chegada, é tal propósito transmitido ao sultão de Melinde. Durante dois dias, sucedem-se as trocas protocolares de presentes, com a correspondente manifestação de propósitos de um pacífico relacionamento, até que, finalmente, ocorre o encontro entre Vasco da Gama e o dito sultão.
"Vasco da Gama - O Homem, A Viagem, A Época", Luís Adão da Fonseca, Edição do Comissariado da Exposição Mundial de Lisboa de 1998 e da Comissão de Coordenação da Região do Alentejo, 1997, pp. 156, 157 e 160
Sem comentários:
Enviar um comentário