domingo, 1 de agosto de 2010

René Pélissier contra os mitos da colonização

René Pélissier contra os mitos da colonização

via Lusofonia Horizontal by Daniel on 7/24/10


Trechos da entrevista de René Pélissier a Nicole Guardiola, publicada na revista África 21 de maio de 2010:

O que despertou seu interesse pela colonização e descolonização portuguesa?

O gosto pelas descobertas. Em França ninguém se interessava pela história colonial portuguesa moderna, e em Portugal havia o Estado Novo, com a sua propaganda mitológica. Senti logo que algo não batia certo quando falavam de cinco séculos de colonização portuguesa. Havia uma fraqueza intrínseca nesta história, a que chamei de colonialismo sem colonos: no início do século XX havia apenas nove mil brancos em Angola, eram menos ainda em Moçambique, e na Guiné não chegavam aos 200. Ler mais
Para desmascarar o mito era preciso uma chave e escolhi a história militar colonial, os relatos das campanhas portuguesas entre 1845 e 1941. E caí em cheio no meio das grandes descobertas, com "d" minúsculo.

A mitificação do passado comum não é uma das fragilidades da CPLP?

Não há acordo possível entre duas versões antagónicas da mesma história, o mito colonial e os mitos de resistência e da luta anti-colonial. Há que desconfiar sempre das memórias, que são sempre o produto da personalidade, da experiência e da cultura de quem as escreve. No caso das colónias portuguesas, as memórias são sempre portuguesas porque, regra geral, os colonizados não sabiam escrever, em português ou em qualquer outra língua. Eu desconfio da minha própria memória e sempre preferi trabalhar sobre os documentos.

Quando em 1999 vi um milhão de portugueses sair à rua em Lisboa, justamente revoltados contra o genocídio indonésio em Timor, fiquei perplexo. Quantos destes manifestantes saberia quem a conquista de Timor pelos portugueses foi o acto mais sangrento de toda a colonização da Insulíndia, e que aconteceu entre 1911 e 1913, não há séculos? Provei que não houve, em parte alguma, entendimentos espontâneos, milagrosos entre os nativos e os missionários e bons samaritanos fardados! Talvez por isso o meu livro sobre Timor não tenha tido sucesso…

Foto: Rui Gaudêncio, Público PT.

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