sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Os três problemas portugueses: filosofia, história e futuro da Pátria (parte 3)

Os três problemas portugueses: filosofia, história e futuro da Pátria (parte 3)

via Espiral Dourada de noreply@blogger.com (RS) em 29/01/09
Ensaio da autoria de António Quadros
(publicado na Folha "57", n.º11 - Junho de 1962)

Primeiro problema:
FILOSOFIA E PÁTRIA

A força da realidade pátria, força que desce do plano intelectual ao plano sentimental, que transparece nas determinações inconscientes, quando a consciência deixou de pensar, a força e a profundidade da sua objectivação nos homens é, por isso, porque é influente e interior em cada um, sistematicamente desviada, aproveitada, canalizada, atraiçoada, pragmatizada. E assim, a política apodera-se da ideia da pátria, desvirtua o seu significado e adapta-o aos seus fins.

É tempo de discernir e meditar. A ideia da pátria está em crise entre nós, precisamente porque toda a acção pragmática que em seu nome é realizada, neste ou naquele sentido, não é deduzida e derivada de uma filosofia da pátria, de uma filosofia portuguesa. Não é possível pensar, postular, legislar, criticar de acordo coordenadas exóticas e, a partir desta realidade mental desfocada e des-axializada, exercer uma actividade propriamente patriótica. Nestas condições, o que fica da pátria é apenas um substracto emocional e retórico, que não suscita uma inteira adesão a uma efectiva participação.

O homem, composto de elementos físicos, de elementos psíquicos e de elementos racionais, apenas se move verdadeiramente pelo acordo sincrónico destas três zonas. Se a razão dos portugueses é desenvolvida e estimulada pelos processos lógicos culturais franceses, alemães ou ingleses, os quais, diga-se de passagem, estão atingindo uma saturação metamórfica nas suas formas idealistas, existencialistas e fenomenologistas, muito precariamente o psíquico, isto é, a sua alma, será capaz de escolher decidida e decisivamente o caminho que é consubstancial à pátria.

É quando a acção não se adequa ao pensamento, que o problema toma aspectos vitais de dramaticidade, de existir agónico e angustiado. Em suma, não há acção portuguesa, acção profunda e cumulativa, sem adequação do agir e do pensar, segundo uma lógica e uma gnosiologia portuguesas, que são os seus autentificados suportes.

Assim, enquanto as nossas escolas, os nossos liceus e as nossas universidades não forem fontes de pensamento português e de filosofia portuguesa, os portugueses viverão permanentemente em crise e em cisão, divididos no seu ser, procurando como derivativo vincular-se a sistemas ideológicos onde a pátria não tem já lugar próprio, sistemas condenados ao fracasso porque o sistema ideológico é hoje uma tentativa metafísica invalidada por todas as correntes modernas sem excepção.

(continua...)

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