quarta-feira, 28 de maio de 2008

Nós, o 28 de Maio e a Revolução Nacional, por Rodrigo Emílio

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via nonas de nonas em 27/05/08
NÓS, O 28 DE MAIO E A REVOLUÇÃO NACIONAL

Há pessoas que não sabem falar - e que não sabem sequer viver - senão no plural; outras há que só no singular sabem viver, que só no singular sabem falar.
Pertencendo embora ao número das segundas, de bom grado aqui renuncio, por agora, à primeira pessoa do singular, trocando-a desta vez pela primeira do plural, - já que, tratando-se de ponderar sobre o que foi a Revolução do 28 de Maio (e até sobre o que ela não chegou a ser...), 60 anos depois da sua eclosão, um direito e um dever me assistem: os de por aqui falar em nome de uma geração que foi a última a servir activamente o Estado Novo em vida deste, e uma das poucas que por ele se bateram depois disso - pelas armas, pelas artes, e por pensamentos, palavras e obras.
A geração decimal de 60 - pois que é dessa mesmo que se trata - serviu, de facto, a Revolução Nacional, defendendo-a, primeiro, da subversão universitária e da subversão cultural; defendendo-a, em seguida, da subversão catolaica e pseudo-cultural e da subversão armada; e, por fim, defendendo o regime do próprio regime, já na agonia do mesmo, isto é: quando a Comissão Liquidatária do Estado Novo - e que viria a ser a Comissão Instaladora do flagelo de Abril - já a seu bel-prazer operava, no alto do poder e nas suas alfurjas, por tudo quanto era sítio, através de grande parte do pessoal menor da «marcelice» e de boa parte do seu pessoal maiorzinho...
(Portugal, por essa época, ainda era da família, mas já dele se não falava senão em voz baixa. As pessoas tinham por ele essa deferência desprezível que nos merece um parente de idade, por cuja herança se esperou tempo demais. Contáva-se tostão a tostão, o que ele poderia deixar, da honra ao resto. Um dia, vem a saber-se que ele tudo delapidara já e que à sua ruína não faltava nada, nada - nem mesmo a vergonha. A Pátria desonrava as guerras que tratava sem ter a hombridade de as fazer até ao fim e já então mendigava em Washington os seus fins de mês. A desonra, como uma grande palavra desajeitada, introduzia-nos, bombásticamente, na vida pública).
Depois... Bom: depois continuámos, ainda e sempre, e na mesma, a defender a memória e bom nome do regime, não já na medida do possível, mas sim na medida do impossível, quando a traição - traição militar, traição diplomática e também política - aos territórios de além-mar-em-África-e-na-Oceania se consumou aquém-do-mar e quando aqui no que era, até então, o cais do império português na Europa - se destravaram contra nós ventos e marés de desatada perseguição, que nos encaminharam, a uns para a prisão; a outros para o exílio e para a clandestinidade; e a outros, ainda, para simples formas de resistência passiva, para formas altivas de intransigência interior.
E, uma vez depois de reagrupados, ainda forças nos soçobraram para montarmos guarda nas colunas corajosas de um semanário de combate suicida - como A RUA -, de lá descendo, de quando em vez, ao meio da rua, em ordem a tirar o medo ao país, que então tiritava, valentemente, de norte a sul.
Foi, de resto, aí - n`«o único jornal da direita que não era» (ou que talvez fosse...) «do centro» -, que desafiadoramente se comemorou, pela primeira vez depois de Abril, o 28 de Maio (promovido, entretanto, a valor proibido) e que se rendeu homenagem àquele, com quem nós, portugueses, «subimos esforçadamente a encosta duma nova restauração», - para, do alto dela, afinal, nos desempenharmos de novo (e até certo ponto, de vez): SALAZAR.
Só à simples menção do seu nome, um vivo frémito de emoção nos assalta, pois que, graças a ele - e sobretudo a ele! - é que nós já hoje nos podemos gabar - «com toda a honra, com todo o orgulho e sem nenhum proveito» - de ter pertencido à era do combate e não à do debate; à idade do duelo e não à do diálogo; à geração da guerra e não à do cessar-fogo.
(Por esta última, nutrimos, aliás um desdém desmedido, um aristocrático desprezo, uma indiferença senhorial, que já não nos damos ao cuidado sequer de disfarçar).
Desgraçadamente, quis o acaso que não nos seja concedido comemorar este Sexagésimo Aniversário do advento do Estado Novo dentro das coordenadas circunstanciais a que o mesmo faz jus. Justo seria, com efeito, que tão memorável efeméride, a pudéssemos nós assinalar dentro de parâmetros históricos diametralmente opostos aos da hora presente. De facto, a única situação consentânea com um quadro evocativo da acção, altamente empreendedora, que o antigo regime protagonizou em mais de quatro décadas nobilitantes, seria o esplendor - e nunca o fim: o fim histórico - de Portugal. Mas o que se há-de fazer?...
Esta terra, pelos vistos, antes que perder-se com gente sabida, do que salvar-se com base em provas dadas por gente sabedora?!...
De modo que chegámos ao que chegámos e aqui estamos no lindo estado de indigência em que nos achamos.
Já agora são menos do que poucos os que não consentem, sem protesto, que quase todos os dias rematados traidores recuperem a pele de honrados cidadãos. Por nós (e digamo-lo, já de caminho) nunca para esses olhamos - que não tenhamos a sensação de estar a sujar a vista; e basta pronunciar-lhes o nome - para termos logo a sensação de estar a sujar a voz; e se calha de lhes ouvirmos a voz - lá temos nós a sensação de estarmos a sujar os tímpanos.
... E assim por diante.
É natural. Somos gente dotada de sentidos bastante apurados e realmente exigentes.
Daí que tudo aquilo que por cá nos servem não nos sirva.
Estávamos nós habituados a «viver habitualmente» - e estávamos, afinal, muito mal habituados, a verdade é essa. E nisso, vão direitinhas para o Estado Novo (honra lhe seja!) todas as culpas e mais algumas. Quer pela alta qualidade, quer ainda pela infinidade dos serviços que à Nação prestou - e esses, sim: de utilidade pública -, ao largo de um período histórico de longo curso, o antigo regime teve o condão de nos dotar de muito má boca... Pena foi que o mesmo regime não se tivesse sabido dotar de orgãos de duração, efectivos e eficazes.
Resultado: a sequência foi desagradável. De um dia para o outro, nós não éramos mais o Cristo das nações, mas um povo ocupado, que choramingava baba e ranho sobre os seus infortúnios. É sempre aborrecido, muito penalizador, imensamente humilhante, termo-nos considerado o umbigo do mundo e ver, às tantas, que não somos senão as suas glândulas lacrimais.
Em 1974, quando foi a vez de russos e americanos se substituírem aos portugueses na «libertação» - digo: na presúria - do solo lusíada, a atmosfera que se criou foi imediatamente a de um exame. O corpo docente do reviralho e todos os seus sociais oportunistas (que já, à data, eram mais do que as mães) pegaram e meteram o país numa sala de aulas. Foi então que cada qual se viu obrigado a recitar, de cor e salteado, a sua liçãozinha de terrorismo. Finda a guerra (e bem mal e porcamente findou ela!...), uma grande aragem de boa vontade percorreu de lés-a-lés o território. Nunca nós nos injuriámos tão alegremente uns aos outros; e jamais nos amámos tanto entre nós, como nessas horas.
A burguesia adorava os terroristas, com uma sensível predilecção pelos terroristas mortos. Os comunistas, esses, andavam perdidinhos de amor pelo exército, em particular, e pelas forças armadas em geral; aliás, eram quase todos Capitães, Majores, Coronéis.
Escusado será dizer que essas jornadas memoráveis forneceram um contingente de dissabores bastante apreciável. No meio disso, éra-nos recordado, a cada passo, que lutávamos pelo Direito - palavra portadora de maiúscula aos domingos e feriados. Mais. Éra-nos constantemente repetido que as chacinas são óptimas para a saúde, que ajudam imenso a activar a circulação do sangue dentro de um país e que aos assassinos, e aos peritos em falsos testemunhos que porventura sobrevivessem (e todos se encontram aí de boa saúde...), estava de antemão reservada uma situação de futuro garantido.
Quanto ao sistema político entretanto implantado, apresenta vantagens bastante consideráveis, uma vez que põe os bárbaros num lado, os neutros noutro e Portugal em parte nenhuma.
Continuando. Dizíamos nós que o regime saído da Revolução de Maio não soube criar orgãos de duração. De facto, não. E o mal foi esse. Nem tudo, porém estará perdido se redutos aguerridos como o MAN tomarem para si esse papel e se dispuserem a reanimar, «rápidamente e em força», a ordem nacional revolucionária, incursa no espírito inicial do regime, e ao depois postergada...
Por outras palavras: nada, ou nem tudo, estará irreparávelmente comprometido se todos aqueles que integram o nosso movimento se empenharem, a fundo, na produção de futuro para o destino da Revolução Nacional. - Como?
- Primeiro que tudo, subtraindo a sobredita Revolução à situação de orfandade em que a deixou o desaparecimento do seu chefe. E, depois, refazendo, de alto a baixo, aquilo que de menos imperfeito começou a ser feito à 60 anos - e a ser desfeito à 12.
Nós é certo que pouco pudemos contra o 25 de Abril; mas o 25 de Abril também nada pôde nem poderá contra nós.
Enganaram-se os que dizem, pois, que a Revolução Nacional dorme em paz.
Não dorme tal. Não. Ainda mexe. Mais: prepara-se para palpitar de novo, e de vez, no ânimo, no corpo e no espírito da generalidade da gente moça.
Quer isto dizer que a Revolução Nacional não fica assim: não vai ficar onde a deixaram os que não souberam fazer até ao fim nem perecer.
O espírito de ingratidão não pode prevalecer sobre o espírito de fidelidade.
Logo, a Revolução Nacional não acabou. A Revolução Nacional continua. Vai continuar. Melhor dizendo: vai começar. Dentro de momentos...
E poderá ser que, graças a Ela, o coração exausto deste velho país recomece, enfim, a bater como dantes.
Rodrigo Emílio.

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28 de Maio, visto por Alfredo Pimenta

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via nonas de nonas em 27/05/08
«... A data de 28 de Maio de 1926 marca efectivamente, na vida do Estado republicano, uma fase essencial.
Aquilo que Pimenta de Castro, o honrado e ingénuo General, e o cavalheiresco Sidónio Pais não puderam realizar, por falta de decisão, o primeiro, por carência de doutrina, o segundo, realizou-o em parte o 28 de Maio.
A ditadura das Espadas não revelou ninguém; a ditadura dezembrista revelou uma alma - Sidónio; o 28 de Maio revelou um Estadista - Salazar.
Salazar é uma ideia, uma doutrina, tendo ao seu serviço uma vontade.»

In Palavras à Juventude, p. 19, ed. Pola Grey, 1941.

«... O país sucumbia asfixiado; o seu instinto de salvação deu-lhe energias para um esforço decisivo.
E foi o 28 de Maio.
Fechou-se o Parlamento. Institui-se a Ditadura.
Todas as Ditaduras são, por natureza, provisórias. A Ditadura do 28 de Maio, trazia, além desse carácter, outros defeitos de origem. Ia a naufragar - quando, de Coimbra, vem um homem de intenções rectas, de saber profundo, de ideias claras, e de vontade de bronze: Salazar. Antes de salvar a Nação, Salazar salvou a Ditadura de 28 de Maio.
Sejamos justos: a Ditadura entregando-se a Salazar, foi inteligente. Quem no-lo trouxe? A Providência.

In Palavras à Juventude, p. 21, ed. Pola Grey, 1941.

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O 28 de Maio por Manuel Maria Múrias

via nonas de nonas em 27/05/08
O 28 de Maio
Passam na próxima segunda-feira cinquenta e três anos sobre o Movimento Militar do 28 de Maio. À voz de Gomes da Costa, herói de África, o Exército levantou-se em Braga, avançou sobre Lisboa — e suspendeu o regime da democracia partidocrática que, ao longo de um século, conduzira Portugal à última das misérias. Quarenta e oito anos depois, uns centos de capitães, tomaram conta das emissoras de rádio e televisão lisboetas, disseram por elas que tinha sido restaurada aquela mesma democracia partidocrática — e, em pouco menos dum lustro, fizeram-nos regressar ao ponto zero de 1926, à miséria, à corrupção, à desordem institucional que nos envergonhara durante cem anos.
Durante os seus dois primeiros anos de vigência, governando em ditadura, os revoltosos do 28 de Maio, sem atentarem contra o que de estrutural fundamentava o velho Estado democrático, limitaram-se a manter a ordem nas ruas e a pregar um ou outro prego. Chegando Salazar ao Ministério das Finanças em 1928, logo nesse ano se equilibrou a Conta Geral do Estado e se iniciou um processo de recuperação económica e financeira do país que bem sustentado politicamente redundou em 1933 numa Constituição que, pretendendo ser corporativa, manteve intocáveis a maioria dos defeitos estruturais da constitucionalidade anterior: o Estado Novo viveu, a partir daí, do génio pessoal de Salazar, pouca gente duvidava que, morrendo Salazar, o regime se afundaria no caos, afundando Portugal com ele.
Temos já perspectiva histórica para bem podermos avaliar o que foram estes nossos últimos cento e cinquenta anos de vida nacional com tantas constituições, tantos regimes, tantas personalidades e tantos erros. Como se andássemos pendurados nos alcatruzes duma nora, temos tido sempre sempre a tendência de regressarmos ao ponto zero, repetindo sistematicamente os erros do passado e recomeçando tudo de novo. O que é fundamental e essencial na organização política do poder tem-se mantido inalterável durante este século e meio. O Estado todo poderoso continua inamovível e inalterável; todos os seus malefícios centralizador, concentracionários e burocráticos têm sido multiplicados de tal jeito que, lentamente, afogaram quase todas as forças vivas da Nação.
O que definiu o Estado Novo foi o génio de Salazar. Para além dele, a tendência estatizante que vinha a impor-se desde a Revolução de Setembro, foi dominando tudo, estrafegando irremissivelmente a criatividade natural dos povos, a sua independência autêntica e — até! — o seu patriotismo.
Como se fora um lema a frase — Portugal é Lisboa, o resto é paisagem — foi aplicada ferozmente pelos burocratas do Terreiro do Paço e de S. Bento: é em Lisboa que se decide todo o importante para a vida da província; como se fora um monstro teratológico a bela cidade de mármore e de granito, cabeça dum império, sorveu durante séculos o melhor dos recursos morais e materiais da Nação.
Sobre este aspecto o Estado Novo limitou a acentuar desmedidamente os erros do passado. O primeiro governo de Salazar não chegava a ter dez membros; o último ultrapassava largamente os vinte. Chegámos ao 25 de Abril com um ministério constituído por mais de trinta pessoas. Vivemos hoje miseravelmente com mais de cinquenta ministros, secretários e subsecretários de Estado, directores-gerais às grosas e muitos milhares de funcionários públicos. O Estado é aquele monstro que profetizava Hobbes continuando como continuamos a agigantar o seu aparelho corremos dentro de muito poucos anos o risco iminente de virmos a muito poucos anos o risco iminente de virmos a ser, todos, seus empregados. Dum momento para o outro, empurrando-se outra vez a porta aberta do Quartel do Carmo, tomando conta das emissoras e calando o governo, podemos estar diante duns novos senhores que, substituindo estes, continuem a obra de agigantamento do poder, transformando Portugal inteiro numa imensa repartição pública.
Salazar foi um estadista de génio. Era um homem de bem. O seu Estado foi eficaz e foi — como ele dizia — uma pessoa de bem porque Salazar foi eficaz e honrado. E o seu Estado desmesuradamente alargado o que subsiste da imensa obra. Todavia, destruído, desordenado e corrupto, atacado de elefantíase, sem ele, só serve para nos atravancar a vida e imobilizar a Nação.
Fundamentalmente a República de 1910 limitou-se a empolar os defeitos da Monarquia de 1820. Depois, o 28 de Maio continuou na mesma senda, até ao 25 de Abril onde os defeitos dos homens se enxertaram nos defeitos do sistema para nos conduzirem à mais extrema decadência, praticamente retornados à configuração geopolítica gerada no Séc. XIII pelo Tratado de Zamora.
Comemorar o 28 de Maio é, por isso mesmo (para além das legítimas implicações contestatárias que o caso tem) comemorar o cume do poder do Estado português, e relembrar revoltadamente a personalidade política de Oliveira Salazar. Mas não pode ser mais nada. Não pode ser, principalmente, uma manifestação de saudade e de retorno às instituições ultrapassadas que o vintismo, o jacobinismo republicano, o corporativismo de 26 e o socialismo de 76 nos impuseram manu militari.
Mas tem que ser o princípio duma revolução estrutural que, contra Lisboa, levanta toda a província a proclamar a independência viva — para que, como em 1910 e como em 1974, não mais seja possível alguém apossar-se da Nação pelo telefone.
O mesmo Exército que nos impôs a democracia partidocrática no século passado, impôs-nos a República em 1910, doou-nos o Sidónio em 1917, obrigou-nos ao corporativismo em 1926, e forçou-nos ao socialismo em 1974. Devendo depender do consenso, depende o Estado português ainda hoje da força das armas; é ilegítimo por isso mesmo; contra o facto nos devemos legitimamente revoltar todos, procurando impor pela pura acção política a verdadeira independência nacional.

Manuel Maria Múrias
In A Rua, n.º 157, pág. 24, 14.06.1979.

O Filósofo

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via NOVA ÁGUIA de Klatuu o embuçado em 27/05/08
Um dos meus grandes projectos, sempre necessariamente inacabado, é arrumar a minha vida; quando me assalta esse desígnio vão, dou por mim a arrumar papéis e a trocar o lugar a livros. Fica tudo ainda mais desarrumado do que estava, como eu, como a minha vida, mas pelos corredores enegrecidos deste afã de Sísifo louco sou recompensado com descobertas inauditas; encontro e surpreendo-me porque me esqueci, porque me esqueci de mim, do que fui um dia, do que planeei e perdi, do que amei e me foi roubado.
Desta vez dei com um pequeno maço de folhas dactilografadas presas por um laço de tecido negro, amarelecidas qual vestígio de uma civilização antiga: eram as Folhinhas daquele senhor sem idade que voltou do Brasil e tocou a minha vida; as Folhinhas de Agostinho da Silva, muitas delas assinadas. São um tesouro: filosofia, religião, filosofia política, traduções de Heine, de Lenau, de Libai, viagens do sonho e da memória, poemas e um fundo, fundo amor pelos homens e pelos bichos, por África, pelo Brasil e por Portugal. Não existíamos ainda, gaiatos de faculdade que éramos, e então aquele senhor alto, seco, de palavras estranhas como um profeta, voltou de além Atlântico e iluminou as nossas vidas; ele enviava-nos as Folhinhas e nós devolvíamos-lhe o preço dos selos, um pouco mais que o preço dos selos – éramos idealistas e amávamos Portugal e queríamos aquele senhor com a idade dos avôs para sempre junto de nós – e assim o ajudávamos a sobreviver, abandonado que estava por tudo e por todos, menos pelo amor dos gatos e das crianças, ignorado por um Estado idiota e por uma Nação de labregos. Isto foi antes dos programas de televisão, do lambe-cú dos intelectuais auto-promovendo-se na moribundez adiada de Agostinho, do perdão do Estado e da devolução tardia do vencimento devido, das condecorações e da hipocrisia nojenta!
Vinham as Folhinhas e ia o dinheiro dos selos, um pouco mais que o dinheiro dos selos, e por vezes vinha o convite para uma conversa; saíamos para as ruas ao encontro do filósofo da lusofonia e do trans-nacionalismo, solenes, batalhão de jovens soldados do Espírito, orgulhosos do nosso patriotismo precoce e puro – ainda não havia nacionalismos psicóticos e o nome de Portugal não era grunhido nas ruas por traidores a soldo de umas alemanhas e umas américas que nem a Alemanha nem a América aceitam como suas. Vinham as Folhinhas, até pouco antes da morte.
Passaram os anos, o filósofo morreu; sonhámos ideias terríveis, jejuámos, esgrimimos, quisemos ver Agostinho a concorrer às Presidenciais – o Alferes da Pátria dissolveria o Parlamento, convocaria as Cortes, o Senhor D. Duarte voltaria ao Trono – e tornámo-nos uma espécie de apátridas voluntários.
Uma manhã, verde, verde, de nevoeiros sagrados, gritou dentro de nós um coração jovem, incorruptível e alto – e hoje temos que enfrentar o nojo destes dias com papéis mortos, entre as mãos lívidas e trémulas.
Viva Portugal! Viva Portugal! Viva Portugal!



Caros Amigos,

Vocês nem imaginam como me tem preocupado essa série de incidentes com imigrantes brasileiros. Como base fundamental há o meu sentimento de que sou multinacional, isto é, por ordem alfabética, brasileiro, com minha capital em Itatiaia, mesmo no cimo de seu pico de montanha, e subindo de preferência pelo túnel, lugar bravio e apaixonante, onde comecei a aprender alguma filosofia com o grande mestre que foi, pelo que sabia e pelo que era como pessoa, o grande mestre Vicente Ferreira da Silva.
Por minha mãe, que lá ficou, e por família, e por amigos que família me são, moçambicano, sendo a capital que lhe sonho, como centro pensador de todo o Índico e de vária África interior, a extraordinária Ilha de Moçambique, moradia de poetas que só tem rival na ponta leste de Timor, e eu sempre com lembrança de sua aldeia indígena e dos monumentos e dos contactos com muçulmanos.
Por fim, solidamente de Portugal, o do Porto, onde nasci, modelo de municípios, mas com avós pescadores algarvios e soldados alentejanos, sendo nele minha capital a velha Barca de Alva, a Alva que ainda está por surgir, e que me educou, fui para ela bem pequeno, a ser de aldeia do interior, pão uma vez por semana, e me ensinou a ler com a perna atada à mesa para não fugir a ver lagarto e cobra, muito mais interessantes que o livro da terrível obrigação. De lá, saudades de montes escalvados e do Pereira ferroviário, do tempo em que o comboio nos levava a Salamanca ou nos trazia espanhóis que vinham à festa do «hornazo».
Nítida recordação da cheia do Douro de 1910, que deu como nome de baptismo a uma Amiga minha o de Crescença de Deus, que acho ser o único a poder bater-se com o de outra Amiga minha, a Generosa do Céu; e com a imagem de Junqueiro, de sobretudo mal alinhado, à espera na estação do início de uma das suas viagens de coleccionador antiquário, quem sabe se mais profundo que poeta e republicano.
Quando Portugal manda embora um brasileiro está-se expulsando a si próprio, àquele que embarcou para o Brasil e levou, no navio de Cabral, uma Trindade Portuguesa, levando consigo o Culto do Divino, que se projecta para o futuro, criando o primeiro modelo do que vai ser um mundo de todas as raças e todas as culturas, para que um dia rompa uma cultura verdadeiramente humana. E com firme vontade de realizar através de todas as dificuldades aquilo que projectou.
Mas a verdade é que Portugal está, às vezes, de mau humor, porque a lei é estrangeira e violenta, a cumprir os deveres que tomou, quando voluntariamente, talvez por solidariedade, talvez por gosto de convivência, ingressou numa Europa Comunitária que, ao que parece, ainda se julga dona daquilo a que chamou Terceiro Mundo. É contra isto que o Brasil deve revoltar-se, não contra quem respeita a lei. Adiante se irá. E pode ser que um dia seja o Brasil, com Portugal, guia do mundo, guia do sonho.

Folhinha do Crescente de Lua da primeira semana de Fevereiro de 1993.


Queridos Amigos,

Ouçam então, que a história é simples. Há uns quinhentos ou seiscentos anos fomos expulsos de Portugal, por desagradarmos a Reis mais interessados na Europa do que na Península e a Papas para os quais o que ia importar era o movimento das Descobertas, que fomos expulsos e proibidos de voltar, dizia eu, todos os que éramos felizes com a ideia de que no futuro, o da Era do Espírito Santo, da plenitude de Deus, em sua fusão com o que criara, estaríamos em êxtase diante do Divino que em tudo de concreto íamos ver, sem que, no entanto, deixasse Seu outro Reino do abstracto.
Todos os Meninos seriam então os primeiros dos homens verdadeiramente inspirados, dedicados ao mundo, como aquele que, na Trindade que Cabral levou ao Brasil, a de Belmonte, está no braço da Criatividade Suprema dando de comer à pomba, isto é, ajudando à sacralização do Universo. A vida ficaria gratuita, com símbolo na comida gratuita do dia da Festa.
Finalmente desapareceriam as prisões e estariam libertos seus presos e seus guardas. Só que aquela extraordinária linha de costa que definia Portugal, não uma simples praia para um mar, mas inteiro litoral para um interminável Oceano, era o ponto donde partir à conquista do que não tomara no período clássico aquele Império Romano que teria, portanto, de abordar todas as terras. Navegação esta que foi proeza dos Portugueses, mas não a que teria sido mais importante, a daqueles que, como missionários, teriam implantado em todo o mundo o Reino do Espírito Santo.
Entretanto, guardados no Brasil para o futuro, tinham feito todas as tentativas para chegarem ao Pacífico, mas não como Magalhães, demasiado servidor da Europa. Até Pedro Teixeira o quis, mas já era tarde, com a força espanhola instalada nos planaltos. O tempo dessa navegação, última e perfeita, chegou agora e de alguma parte dela talvez nos traga informe alguma destas Folhinhas para que tendes paciência.

Lua Luar dum Maio de 93.


Um bilhetinho de vosso irmão servidor.

Brasil e China se encontrarão na África, vindo um pelo lado do Atlântico de São Tomé, chegando a outra, depois de Índias e Índico, à ilha que foi outrora capital de Moçambique e será, daí por diante, capital de toda a vaga que se levante no Mar das Índias e de todas as terras que ele, como experiência ou sonho, de algum modo animar. Será, de ambos os povos que vêm, uma invasão de oferta, de solidariedade e de aprendizagem própria. O Brasil trará às Africas do melhor que tiver aparecido na América ou na Europa, não daquilo que serviu no passado para abater e explorar. Também com o que vier do Oriente, com sua economia de produzir e distribuir com igualdade, tudo apurado ainda na travessia que teve de fazer da velha Rússia para chegar ao Atlântico Norte, erguerá a África ao universo uma face livre e nova, com este também iluminado naquela atmosfera de alma que virá de se terem fundido o Taoismo de Lao-tsu e o Franciscanismo do jovial criador de Assis. O mundo, discípulo de África, mestra do ser e do fazer, lhe será fiel e, num fim que se repetirá, a Transporta à criatividade pura, em que cada um de nós mergulhará, ainda porventura com a perfeita paz de não termos consciência do que fomos criando. E talvez, de quando em quando, outro irmão servidor vos diga que assim realizaram o seu ideal, e para tudo o que vive, os portugueses de tempo antigo que só ansiavam pelo êxtase eterno perante o Divino, de existência a um tempo real e imaginária, com o triunfo de toda a Poesia que a criança é ao nascer e a liberdade que será para todos e o gratíssimo prazer de uma vida que não será paga, mas de força criada e de amor gozada.

[rubricado]


Amigos,

Estamos ainda bem longe, talvez a séculos, de que tal suceda, mas um dia se verificará que, depois de tanto tempo, de tanta geração de colonialismos, quer os de potências europeias, quer os de força islâmica, quer os de internacionais entidades americanas, foi a África restituída a si própria pela obstinada, calma, paciente e exigente influência do Brasil e da China, com alguma velha semente ibérica deixada num ponto ou outro do Magrebe, sobretudo, diria eu, no Marrocos ou naquela embaixada que no Cairo pensava em expedições etíopes, e com o Brasil do lado de Angola, a meditar das varandas de São Tomé, no redesenho dos mapas latinos ou germânicos da distribuição pelos novos donos da infinda pluralidade única daquelas novas terras, e a China das bandas de Moçambique, aí com a tarefa algum tanto facilitada, ou guiada, pela tradição do acertado império do Monomotapa. E quando diremos que a África está reentregue a si mesma?

Quando se ouvir ou se souber de algum africano que propôs acrescentos a Einstein ou reprovou Kant na língua que em pequeno falava com sua mãe, sem ter feito o esforço antibiológico de ter de se exprimir noutra língua, de preferência numa do domínio indo-europeu. E na dita língua materna ensinando ao resto do mundo muita coisa que ainda precisa de aprender, com ligação a um correcto comportamento social e solidário. E livre. Mas qual a atitude enquanto se espera? Pois a de achar que ainda se está distante e, ao mesmo tempo, que tudo já aconteceu. O trabalho vai ser o de, sem falta alguma, que ainda está distante o que já aconteceu, juntar a face do adquirido com a face do ambicionado. Querem um exemplo? Pois lembro o que acontecia com os Portugueses que, desrespeitando Tordesilhas e a pontifícia autoridade, iam fazendo mapa falso sobre mapa falso, sabendo que ainda tinham muito que andar, mas, simultaneamente que já descansavam à beira do Pacífico que sempre se lhes negou. Mas o Brasil lá chegará e com inteira obediência à lei com que todos os Povos estejam de acordo. Sabeis o resumo? Ser e não ser são a chave do Ser.

Minguante de Maio. Maio de 93. Ou de qualquer ano em que a tal se volte.
Agostinho

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terça-feira, 27 de maio de 2008

Os traidores vendilhões da Pátria comemoraram a perfídia, a cobardia e a traição

OS TRAIDORES VENDILHÕES DA PÁTRIA COMEMORARAM
COMEMORARAM A PERFÍDIA, A COBARDIA E A TRAIÇÃO.

— Comemoraram certamente os mais de 3 milhões de mortos em Angola.
— Pacíficos seres humanos, pretos, brancos e mestiços, foram brutalmente espoliados, assassinados, humilhados, violados e muitas vezes perante a passividade dos militares portugueses.
— Também comemoraram o dia 15 de Março de 1961, data em que em Angola, foram assassinadas pela UPA, 5.000 pessoas, sendo a maioria desses crimes realizados na presença dos familiares.
Os pais viram os filhos esquartejados na sua presença e as mulheres violadas e esventradas diante dos maridos e dos filhos.
— Comemoram as ordens para que os terroristas do MPLA aterrorizassem por todos os meios os brancos, matando, pilhando e incendiando a fim de provocar a sua debandada de Angola.

— Comemoraram certamente o assassinato na Guiné, de milhares de comandos africanos que o Ten. Cor. Fabião desarmou e entregou à senha assassina do PAIGC que os fuzilou.
— Talvez também tenham comemorado o assassinato do régulo dos manjacos, Joaquim Baticã Ferreira, que na Guiné defendia que a melhor solução era aceitarem o governo de Portugal para viverem em paz. Também muitos outros régulos foram assassinados perante a passividade do tal Fabião.

— Comemoraram a entrega de Moçambique a 1.200 maltrapilhos, guerrilheiros da FRELIMO, muitos deles marginais da Tanzânia e Zâmbia.
Também se regozijaram pelo vexame, que consta, de militares portugueses na zona de Cabo Delgado terem sido sodomizados pelos guerrilheiros da FRELIMO.

— Também possivelmente comemoraram a entrega forçada de Cabo Verde, de São Tomé e Príncipe e também de Timor contra a vontade das populações.

— Devem ter comemorado o assassinato do piloto Nascimento Costa do Paquete Santa Maria.

— Até talvez tenham comemorado o assassinato do Sub-secretário de Estado do Exército, Tenente-Coronel Jaime Filipe da Fonseca, que assassinaram no assalto ao quartel de Beja em 1 de Janeiro de 1962.
Assalto comandado pelo capitão Varela Gomes.

— Comemoraram, certamente com grande regozijo, a destruição de todo um Império de mais de 500 anos de administração portuguesa em que as populações viviam em paz.

O que dói é que a justiça dos homens por muito que o desejemos já nada fará.


Mas temos o dever de transmitir à juventude a VERDADE.
E PELA MEMÓRIA DE SALAZAR ASSIM FAREMOS.

Cumprimentos
Artur Silva -- Santarém

Fonte: Blogue "Salazar o Obreiro da Pátria" - comentário no livro de visitas do blogue de 26-04-2008 18:55:50

sexta-feira, 23 de maio de 2008

«Sobre a nudez crua da verdade, o manto diáfano da fantasia»

Enviado para você por Rui Moio através do Google Reader:

via Estado Sentido de noreply@blogger.com (cristina ribeiro) em 23/05/08

Esta a frase, retirada d'«A Relíquia», que inspirou Teixeira Lopes na concepção da estátua sita no Largo do Quintela, em Lisboa.
Aquando da inauguração do monumento, oferecido à cidade pelos amigos e admiradores de Eça de Queirós, Ramalho Ortigão, tomou da palavra para dizer: " Não é um retrato literário do insigne escritor que me proponho traçar- o meu fim é unicamente fazer notar a Lisboa que Eça é, como romancista, o mais fundamental e genuinamente lisboeta de todos os escritores nacionais(...).
Lisboa foi o seu laboratório de arte, o seu material de estudo, a sua preocupação de crítico, o seu mundo de escritor(...)e, a pouco e pouco, se tornou ele próprio enraizadamente lisboeta. Os seus contos e as suas novelas são o espelho desse consórcio do seu espírito com o espírito da vida lisbonense(...). E nesse vasto cenário toda uma densa população pulula, ama, pensa, estuda, combate, intriga, devora ou boceja...; contemplando o enigmático vulto de mulher olímpica, agora aqui colocado, junto do vulto do meu saudoso amigo, eu concluo perguntando-me se essa gloriosa figura, em vez de personificar uma pura e etérea abstracção estética, não é antes a estátua mesma de Lisboa".

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quinta-feira, 22 de maio de 2008

Relação da viagem de Vasco da Gama - 22.05.1498

BOS: Notas de Luís de Albuquerque

Enviado para você por Rui Moio através do Google Reader:

via Carreira da Índia de Leonel Vicente em 22/05/08

Esta cidade de Calecut é de cristãos, os quais são homens baços. E andam deles com barbas grandes e os cabelos da cabeça compridos, e outros trazem as cabeças rapadas e outros tosquiados; e trazem em a moleira uns topetes, por sinal que são cristãos; e nas barbas bigodes. E trazem as orelhas furadas, e nos buracos delas muito ouro; e andam nus da cinta para cima, e para baixo trazem uns panos de algodão muito delgados; e estes que assim andam vestidos são os mais honrados, que os outros trajam-se como podem. As mulheres desta terra em geral são feias e de pequenos corpos; e trazem ao pescoço muitas jóias de ouro, e pelos braços muitas mantilhas, e nos dedos dos pés trazem anéis com pedras ricas. Toda esta gente é de boa condição e são maviosos, quanto ao que parecem; e são homens que, segundo a primeira fase, sabem pouco e são muito cobiçosos. […]

E daqui nos fomos e, à entrada da cidade, nos levaram a outra, a qual tinha estas mesmas coisas acima contadas. Aqui recresceu a gente muito, que nos vinha ver, que não cabia pelo caminho. E, depois que fomos por esta rua um grande pedaço, meteram o capitão em uma casa e também nós outros com ele, por respeito da gente que era muita. Aqui mandou el-rei um irmão do bale, o qual era grande senhor nesta terra, o qual vinha para ir com o capitão, e trazia muitos tambores e anafis e charamelas e uma espingarda, a qual ia atirando ante nós; e assim levaram o capitão com muito acatamento, tanto e mais do que se podia em Espanha fazer a um rei. E a gente era tanta que não tinha conto; e os telhados e casas eram todos cheios, afora a que connosco ia de roldão, entre a qual gente iriam ao menos dois mil homens de armas; e quanto mais nós chegávamos para os paços, onde el-rei estava, tanto mais gente recrescia. E, tanto que chegámos ao paço, vieram para o capitão homens muito honrados e grandes senhores, afora outros muito que já iam com ele; e seria uma hora de sol quando chegámos aos paços; entrámos por uma porta a um terreiro muito grande e, antes que chegássemos à porta onde el-rei estava, passámos quatro portas, as quais passámos por força dando muitas pancadas à gente; e quando chegámos à derradeira porta, onde el-rei estava, saiu de dentro um velho, homem baixo de corpo, o qual é como bispo, e o rei se rege por ele nas coisas da igreja; o qual abraçou o capitão à entrada desta porta, e à entrada dela se feriram homens e nós entrámos com muita força. El-rei estava em um patim, lançado de costas em uma camilha, a qual tinha estas coisas: um pano de veludo verde debaixo e, em cima, um colchão muito bom; e, em cima do colchão, um pano de algodão muito alvo e delgado, mais do que nenhum linho; e também tinha almofadas deste teor; e tinha à mão esquerda uma copa de ouro muito grande, da altura de um pote de meio almude, e era da largura de dois palmos na boca, a qual era muito grossa, ao parecer; na qual talha lançava bagaço de umas ervas, que os homens desta terra comem pela calma, a qual erva chamam atambor; e da banda direita estava um bacio de ouro, quanto um homem pudesse abranger com os braços, em o qual estavam aquelas ervas, e muitos agomis de prata, e o céu de cima era todo dourado. E assim, quando o capitão entrou, fez sua reverência, segundo costume daquela terra, a qual é juntar as mãoes e levantá-las para o céu, como costumam os cristãos levantar a Deus; e, assim como as levantam, abrem-nas e cerram os punhos mui asinha. E ele acenou ao capitão, com a mão direita, que se fosse para debaixo daquele cerrado onde ele estava; porém o capitão não chegava a ele, porque o costume da terra é não chegar nenhum homem ao rei, salvo chegava a ele um seu privado que lhe estava dando aquelas ervas; e quando algum homem lhe fala tem a mão ante a boca, e está arredado. Assim como acenou ao capitão olhou para nós outros, e mandou que nos assentássemos em um poial, perto dele, em lugar que nos via ele estar; e mandou-nos dar água às mãos, e mandou trazer uma fruta, que é feita como melões, salvo que de fora são crespos, mas de dentro são doces; e também nos mandou trazer outra fruta, que é como figos e sabe muito bem; e tínhamos homens que no-los estavam aparando, e el-rei estava olhando como nós comíamos, e estava-se rindo para nós; e falava com aquele seu privado, que estava à sua ilharga dando-lhe a comer aquelas ervas. E depois disto olhou ao capitão, que estava sentado defronte, e disse que falasse com aqueles homens com que estava, que eram muito honrados, e que lhes dissesse o que ele quisesse, e que eles lho diriam; respondeu o capitão-mor que ele era embaixador de el-rei de Portugal, e que lhe trazia uma embaixada e que não a havia de dar salvo a ele; disse el-rei que era muito bem, e logo o mandou levar dentro, a uma câmara; e, quando foi dentro, el-rei se levantou donde estava e se foi para o capitão, e nós ficámos em aquele lugar. Isto seria ali junto com o sol-posto; e, assim quando el-rei se alevantou, foi logo um homem velho que estava dentro, naquele patim, e levantou a camilha; e a baixela ficou ali; el-rei quando foi onde estava o capitão, lançou-se em outra camilha, em que estavam muitos panos lavrados de ouro, e fez pergunta ao capitão: que era o que queria? E o capitão lhe disse como ele era embaixador de um rei de Portugal, o qual era senhor de muita terra e era muito rico de todos as coisas, mais que nenhum rei daquelas partes; e que havia sessenta anos que os reis seus antecessores mandavam, cada ano, navios a descobrir aquelas partes, porquanto sabiam que, em aquelas partes, havia reis cristãos como eles. E que, por este respeito, mandavam a descobrir esta terra, e não porque lhes fosse necessário ouro nem prata, porque tinham tanto em abundância que lhes não era necessário havê-los desta terra; os quais capitães [desses navios] iam e andavam lá um ano e dois, até que lhes falecia o mantimento, e sem acharem nada voltavam para Portugal; e que agora um rei, que se chamava D. Manuel, lhe mandara fazer estes três navios e o mandara por capitão-mor deles; e lhe dissera que se ele não tornasse a Portugal até que lhe não descobrisse este rei dos cristãos, e que se tornasse que lhe mandaria cortar a cabeça; e que se o achasse que lhe desse duas cartas, as quais cartas lhe ele daria ao outro dia; e que assim lhe manda dizer, por palavras, que ele era seu irmão e amigo. El-rei respondeu a isto, e disse que ele fosse bem-vindo, e que assim o havia ele por irmão e amigo, e que ele lhe mandaria embaixadores a Portugal com ele; dizendo o capitão que assim lho pedia de mercê, porquanto ele não ousaria aparecer presente [a] el-rei, seu senhor, se não levasse alguns homens da sua terra. Estas e outras muitas coisas passaram [entre] ambos, dentro daquela câmara; e, porquanto era já muito noite, el-rei disse que: com quem queria ele pousar, se com cristãos, se com mouros? E o capitão lhe respondeu que nem com cristãos, nem com mouros; e que lhe pedia por mercê que lhe mandasse dar uma pousada sobre si, em que não estivesse ninguém; e el-rei disse que assim o mandava; e nisto se despediu o capitão de el-rei, e veio ter connosco onde estávamos lançados em uma varanda onde estava um grande castiçal de arame que nos alumiava; e isto seriam já bem quatro horas da noite. […]

(via "História e Antologia da Literatura Portuguesa – Século XVI – Literatura de Viagens – II" – Fundação Calouste Gulbenkian, Boletim nº 23, Dezembro de 2002 - a partir de "Relação da Primeira Viagem de Vasco da Gama (1497-1499)", introd. e notas de Luís de Albuquerque, Lisboa, CNCDP/ME, 1989)

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António Lobo Antunes Quinta-feira, 22 de Maio de 2008

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Opinião

Tenham piedade de nós

- Conheces algum artista que não sofra, conheces algum artista feliz? Todos eles atormentados, contraditórios, num desespero e numa angústia constantes, mesmo sob o humor, sob a alegria. Os meus queridos russos, Tolstoi, Gogol, Tchecov

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Em março fui a Paris para uns colóquios na Sorbonne e na Fundação Gulbenkian: estranha coisa falar e ouvir falar dos meus livros. As pessoas tão generosas e eu a sentir que mal comecei. Em março ou abril? Princípio de abril, julgo que princípio de abril, as flores começavam, cheirava um bocadinho a sol. Jantava todas as noites com a Dominique e a Victoire, a mulher e a filha do Christian Bourgois, meu editor, que morreu em dezembro. Meu editor, meu amigo. Tenho tantos editores e não sou amigo de quase nenhum. Do Christian era, sou. Nunca foi um homem fácil. Eu também não. E, no entanto, que maravilha de conversas no silêncio, que partilha tão grande. Desde muito cedo, como ele o disse, fez seu o preceito de um general veneziano do século dezassete, chamado Montecuculi. Montecuculi não lembra ao Diabo. Afirmava o general que é preciso agarrar sempre a ocasião pelos cabelos mas não esquecer que ela é careca. E isto é o único programa de vida possível. A casa desabitada sem o Christian e no entanto a sua presença em toda a parte. Parece um paradoxo: não é. Jantares difíceis para mim, carregadinho de saudades. Tantos anos de trabalho juntos, decepções, alegrias. Não há escritor no mundo que admire tanto como tu, escreveu-me na carta em que anunciava o cancro. E depois três anos. E depois nada. A Dominique e eu falámos e falámos para mobilar o silêncio. Até de livros. A certa altura veio com um álbum da Plêiade dedicado a Faulkner, escritor dantes tão importante para mim:

– O que o homem sofreu a vida inteira

disse ela. E de facto sofreu como um cão a vida inteira. Respondi

– Conheces algum artista que não sofra, conheces algum artista feliz?

Todos eles atormentados, contraditórios, num desespero e numa angústia constantes, mesmo sob o humor, sob a alegria. Os meus queridos russos, Tolstoi, Gogol, Tchecov. Scott Fitzgerald, que sustentava não ser possível escrever a biografia de um escritor porque ele é muitos. É necessário roermos as passas do Algarve para que o leitor tenha prazer. E que mistura de sangue e júbilo na criação, outros sentimentos de que não falo por pudor. Graham Greene agora, para variar: «um escritor é um homem de barba por fazer e copo na mão, cercado de criaturas que não existem». E Gogol destruindo toda a segunda parte das Almas Mortas, uma obra--prima, chorando. Já que estou em maré de citações lembro-me de Apollinaire, poeta com quem aprendi muito: «piedade para nós que trabalhamos nas fronteiras do ilimitado e do futuro». Era isso que ele suplicava: piedade para nós, tende piedade de nós. A beleza que nos dão saiu-lhes do pêlo, rasgaram a alma por ela. E a Dominique a olhar para mim com a tal piedade que Apollinaire desejava. Como é possível coexistirem num só homem ou numa só mulher tanto sofrimento e tanta exaltação? O apartamento do Christian, cheio de quadros, retratos, livros. As árvores dos Invalides, a rua Vaneau, onde Gide morava, a mesma do hotelzinho em que fico sempre, no quarto sessenta e cinco com vista para um jardim. Os pombos de Paris tão diferentes dos pombos de Lisboa, esguios, ferozes, poisados nos ramos, não nas casas. Piedade para nós, etc., piedade para o nosso trabalho. Quero morrer de caneta na mão, meu Deus fazei com que eu morra de caneta na mão a lutar com as emoções, as palavras. A lutar com o Anjo, pobre Jacob que sou. A gente deixa a pele nisto. Se alguma glória posso ter é essa: não os prémios, o reconhecimento, o louvor: apenas a sina de uma vida dedicada a tentar iluminar o mundo com a minha lanterninha. Por muito grande que seja não passa de uma lanterninha. Graham Greene enganou-se, as criaturas que ele diz que não existem, existem de facto: somos nós. Habitamos o Monte dos Vendavais, a Guerra e Paz, as Meninas de Velázquez, os trios de Beethoven, o Danúbio Azul, e ao habitar o imenso país que essas obras são vencemos o tempo e tornamo-nos imortais. Apollinaire dizia piedade para nós, e em lugar de piedade o que devemos sentir é gratidão: deram nexo à nossa existência. Fizeram da gente seres enormes, apesar de bichos da terra tão pequenos como no verso de Camões. Esta é a ditosa Pátria minha amada: nunca li tal coisa sem me comover. Parece tão simples, não é? Esta é a ditosa Pátria minha amada: reparem na mão que é necessária para chegar a isto.
A Dominique:

– O que o homem sofreu a vida inteira

e é verdade. Sofreram a vida inteira, mas é graças a eles que estamos vivos.
É graças a eles que somos dignos do Reino dos Céus, que trouxeram para a terra.
E os pombos de Paris a olharem para mim de banda, com vontade de me engolirem. Por favor não me engulam por enquanto: há tantos livros em mim à espera de serem escritos.


Fonte. Visaonline de 22Mai2008

quarta-feira, 21 de maio de 2008

[Sobre o saber ler]

"Todo homem que sabe ler tem o poder de se ampliar, de multiplicar as formas de sua existência, e de fazer sua vida repleta, significante e interessante."

Fonte: Blogue "O Livreiro Assassino"

"CARTA DE MARCOS FLAVÍNIO, CENTURIÃO DA 2ª COORTE DA LEGIÃO AUGUSTA, A SEU PRIMO TERTÚLIO, QUE FICOU EM ROMA"

Enviado para você por Rui Moio através do Google Reader:

via CÓDIGO INCORRECTO de TRIARIO em 17/05/08
"CARTA DE MARCOS FLAVÍNIO, CENTURIÃO DA 2ª COORTE DA LEGIÃO AUGUSTA, A SEU PRIMO TERTÚLIO, QUE FICOU EM ROMA"

Tinham-nos dito, no momento em que deixámos terra natal, que partíamos em defesa dos direitos sagrados que nos são conferidos por tantos cidadãos instalados lá longe, tantos anos de presença, tantos benefícios concedidos às populações que têm necessidade do nosso auxílio e da nossa civilização.
Pudemos verificar que tudo isso era verdade, e, visto que o era, não hesitámos em derramar o imposto de sangue, em sacrificar a nossa mocidade, em imolar as nossas esperanças.
Não deploramos nada, mas, enquanto aqui somos animados por este estado de espirito, dizem-nos que aí em Roma se sucedem as intrigas e as conspirações, se desenvolve a traição e que muitos, hesitantes e perturbados, cedem com facilidade às piores tentações de abandono e aviltam a nossa Nação.
Não posso acreditar que tudo isso seja verdade, até porque outras guerras ainda muito recentes nos mostraram como podia ser nefasto semelhante ambiente humano e a que abdicações ele nos poderia conduzir.
Suplico-te, pois, caro primo, que, o mais breve possivel, me tranquilizes e me digas até que ponto os nossos concidadãos nos compreendem, nos defendem e nos protegem, como nós próprios protegemos a grandeza do império.
Se tudo fosse diferente, se tivessemos de deixar em vão os nossos esqueletos embraquecidos sobre as imensidões africanas e asiáticas, então Roma, a descuidada, veria abater-se sobre ela a cólera das legiões.

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terça-feira, 20 de maio de 2008

Camilo visto por [Fialho de Almeida]

Enviado para você por Rui Moio através do Google Reader:

via Estado Sentido de noreply@blogger.com (cristina ribeiro) em 20/05/08
3. Fialho de Almeida

Ele mesmo um exímio escritor, tanto na faceta de ficcionista («Contos», «A Cidade do Vício»...), como nas de cronista e polemista mordaz, o que se espelharia na sua Obra mais conhecida, «Os Gatos», onde não poupa a sociedade do seu tempo, nem a "republiqueta"então emergente, na linha, aliás das «Farpas» de Ramalho Ortigão, este pessimista disse do homem de Seide :
"A mais bela luz do génio de Camilo faísca na sua obra sarcástica. Nada pode dar ideia da veemência e pujança desta prosa de Vulcano, batida na forja dos coriscos e dos raios, onde co'as asperidões e rudezas da antiga linguagem se entrelaçam os nervosismos elásticos e as graças subtis do mais refinado poeta cortesão do penúltimo século. Eu não sei de ironia que tenha mais causticidade, nem de imaginação onde se insculpam mais finas rendas(...).
Na caquexia das letras actuais, quando todas as energias parecem finar-se, e todas as originalidades irem adormecendo, a pletora deste homem faz medo, como em país de anões os 'grandia ossa' da fama primitiva."

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segunda-feira, 19 de maio de 2008

O Planeta Azul

via sorumbático de noreply@blogger.com (A. M. Galopim de Carvalho) em 19/05/08
Por A. M. Galopim de Carvalho

No dia do planeta Terra, neste Ano Internacional que lhe foi dedicado pela Unesco, parece-me oportuno retomar algumas reflexões que não é de mais relembrar.

É NESTA TERRA, O PLANETA AZUL, envolta nos farrapos brancos das nuvens, que reside tudo o que temos: o ar que respiramos, a água que bebemos, o chão que pisamos e nos dá o pão. É só com isto que contamos para viver. É, pois, fundamental, conhecer melhor esta nossa casa que nos transporta através da imensidão do espaço, à velocidade de 30km por segundo.
O nosso Planeta, velho de quase quatro mil e seiscentos milhões de anos, lar da biodiversidade, incluindo a humanidade inteira, não foi sempre como hoje o conhecemos. Esta nossa Terra é o resultado de uma longa e complexa evolução, e o homem é o fruto mais jovem dessa mesma evolução, numa cadeia imensa de inter-relações em que participaram as rochas, a água, o ar e todos os seres vivos. Assim, interessa ao cidadão conhecê-la melhor, a fim de bem avaliar os problemas que se lhe põem no seu relacionamento com o ambiente natural.
O grau de complexidade a que chegámos foi crescente desde o início do tempo, isto é, nos treze a quinze mil milhões de anos de existência do Universo que julgamos conhecer. Das partículas primordiais passou-se aos átomos e, só depois, às moléculas, cada vez mais complexas. A partir destas, a evolução caminhou no sentido das células mais primitivas, que fizeram a sua aparição na Terra há mais de três mil e oitocentos milhões de anos, através de uma cadeia abiótica de estádios progressivamente mais elaborados, onde o ensaio e o erro tiveram a seu favor 75% ou mais dessa enormidade de tempo. Dos seres unicelulares mais rudimentares aos primeiros metazoários, surgidos há seiscentos a setecentos milhões de anos, foi consumido mais cerca de 20% desse mesmo tempo. Restou, pois, pouco mais de 5% para que, numa nova cadeia de complexidade crescente e a ritmo cada vez mais acelerado, se caminhasse dos invertebrados primitivos ao Homem. Do nosso aparecimento no Planeta Azul, onde ocupamos o topo da escala biológica, aos dias de hoje, foi um passo de apenas 0,000 1% do tempo universal da criação. Face à eternidade que falta cumprir a este nosso planeta, estimada em mais alguns milhares de milhões de anos, a presença do Homem na Natureza é ainda extraordinariamente curta, insignificante e, portanto, passível de erro e de extinção, como aconteceu com inúmeras espécies. A Terra, no quadro em que se nos apresenta hoje, é o resultado de um sem número de agressões sofridas ao longo da sua velhíssima história. Contudo, ela é um sistema dinâmico que se auto-regula e, como tal, tem sabido encontrar resposta a todas essas vicissitudes e vai, sem dúvida, continuar a fazê-lo. O dano que lhe podemos causar, no mau uso que dela fizermos, é mudar-lhe as condições que nos são favoráveis e que bem conhecemos, dando origem a outras que nos poderão ser altamente adversas. Assim, ao maltratá-la, o Homem está a atentar também contra si próprio, contra a humanidade. Porém, o planeta irá prosseguir, mesmo sem a nossa inteligência, e acabará por encontrar novos caminhos, podendo voltar a criar um outro ser inteligente ou, até, mais inteligente do que esta versão moderna e egoísta de Homo sapiens, que somos nós. Para tal só necessita de tempo, de muito tempo, e isso não lhe irá faltar.
«Público» de 23 Abr 08

domingo, 18 de maio de 2008

Carta de Einstein sobre o judaísmo

Enviado para você por Rui Moio através do Google Reader:

via nonas de nonas em 17/05/08
O Público de hoje, revela a existência de um carta de Einstein endereçada ao filósofo Eric Gutkind, datada de 3 de Janeiro de 1954, onde Einstein rejeita a ideia de que os judeus são um povo eleito por Deus. "A religião judaica, tal como todas as outras, é uma encarnação das superstições mais infantis. E o povo judeu, ao qual estou contente por pertencer e por cuja mentalidade tenho profunda afinidade, não é diferente de qualquer outro povo para mim." E ainda: "Tanto quanto a minha experiência permite, [os judeus] não são melhores do que outros grupos humanos, apesar de estarem protegidos dos piores cancros pelo facto de não terem poder. De outro modo, não vejo neles nada de "escolhido"."

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sábado, 17 de maio de 2008

O 31 da Armada dá voz aos seus leitores

Enviado para você por Rui Moio através do Google Reader:

via 31 da Armada de Sofia Bragança Buchholz em 17/05/08

"Crónica da memória

Quero fazer uma viagem no tempo. Quero que fechem os olhos e quero que imaginem o cenário que vos vou contar.

1975, Porto de Lisboa. Imaginem um navio de cruzeiro, de enormes dimensões, lindo e exuberante que acaba de chegar. Se não fosse o ano de 1975, se não fossem as circunstancias que levavam muita gente a viajar naquele navio, eu diria que a viagem era uma viagem de sonho. O navio tinha cinema, piscina, bares, salões grandes e bonitos que se viam à luz de velas. Era Inverno. Pairava no ar uma neblina (como na lenda de D. Sebastião), estava um tempo chuvoso, frio, cinzento, a condizer com o estado de espírito da Nação.

Uma mulher estava debruçada a ver o mar. Observava aquela terra que nada lhe dizia, que nunca tinha visto antes, apesar de ter a sua nacionalidade. Os olhos verdes viam tudo aquilo, o corpo sentia o frio, o sangue gelava, mas no entanto, a única coisa que a sua expressão deixava transparecer era uma enorme tristeza.

Estava frio e ela vinha de camisa de manga curta. O tempo era cinzento mas a sua camisa era de cores vivas e tropicais. Esta mulher mais a família vinham de África. Vinham do quente, do bonito, dos cheiros e das cores exóticas. Mas também vinham fugidos e com medo. Vinham sem futuro, sem dinheiro, sem nada a não ser uma mala com as recordações de uma vida e de uma terra que nunca mais iriam ver e que nunca mais iria voltar a ser a mesma. Essa terra que tinham aprendido a chamar lar, era a mesma que tinham visto a ser destruída e a morrer aos poucos e poucos. Essa era a terra que só iriam ver nas fotografias a preto e branco que se encontravam dentro dessa mala, e que fora das poucas coisas que conseguiram salvar.

Trinta anos depois, esta mulher já com netos, mostra-lhes essas fotografias a preto e branco. Mostra-lhes os sítios onde nasceu, onde cresceu, onde casou, onde criou os filhos. Nunca lá voltou, apesar de ter tido oportunidade. As razões para não o fazer, nunca as disse, mas os netos desconfiam. Esta mulher, anónima mas que representa tantas outras e outros que vieram para um país que não conheciam, alguns que nunca tinham sequer visitado, com gentes e mentalidades tão diferentes do que eles estavam habituados, vieram sim; mas com memórias e imagens da sua verdadeira terra, que nunca esqueceram. Imagens, essas que não queriam ver destruídas. E por isso, alguns, nunca lá voltaram."

Um texto da responsabilidade e autoria da nossa leitora Daniela Major

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sexta-feira, 16 de maio de 2008

Camilo visto por

Sent to you by Rui Moio via Google Reader:

via Estado Sentido by noreply@blogger.com (cristina ribeiro) on 5/16/08
3. Silva Pinto

Ao mesmo tempo que dirigia os maiores encómios a confessos adversários de Camilo, como Teófilo Braga, este jornalista e escritor não desperdiçava uma oportunidade para tentar destruir a reputação daquele, tanto no plano literário como no da sua dignidade de homem.
Mas, após uma longa série de polémicas, iniciadas em 1874, em que nenhum dos dois foi parco no uso de uma linguagem virulenta, semeada de insultos e calúnias, a reconciliação viria cinco anos mais tarde, passando o que iniciara tamanha hostilidade,, de panfletário desbocado a admirador incondicional daquele a quem passou a considerar Mestre, e como tal se lhe dirigia, a ponto de escrever: "Era o mais completo e puro tipo de fidalgo, assim no aspecto como no trato, (...). O maior escritor de Portugal nunca me impôs, em convívio a sua opinião literária. Àquele vasto e poderosíssimo cérebro,,,"
Depois de ter começado a frequentar a casa de Seide, adquiriu na localidade habitação própria para melhor desfrutar "da sua genialidade".

Things you can do from here:

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Nunca é tarde para ver a luz, como o prova Einstein

Enviado para você por Rui Moio através do Google Reader:

via cinco dias de Luis Rainha em 15/05/08

Luis Buñuel disse uma vez que iria converter-se ao catolicismo antes de morrer, só para aborrecer os amigos. Boutade à parte, certo é que a senhora Morte tem um carisma mais do que bastante para levar muita alma antes ferreamente racionalista a tentar, in extremis, jogar pelo seguro, agarrando-se a qualquer coisa com ar de bóia salva-vidas.
Albert Einstein, ao que parece, teve a lucidez e a coragem bastantes para tomar o caminho inverso: da crença num Deus manifesto e visível na ordem do Universo, passou, nos últimos dias da sua vida, ao realismo mais cru: "a palavra Deus para mim é nada mais que a expressão e produto da fraqueza humana, a Bíblia é uma colecção de lendas honradas, mas ainda assim primitivas, que são bastante infantis."
Esta bela declaração está numa carta recém-descoberta, em que o físico expõe com clareza total a sua descrença em Deus, no mito do "povo escolhido" e em qualquer forma de actividade religiosa. Certo é que passagens como a que transcrevi estão a anos-luz de anteriores palavras suas acerca da Bíblia, como a conhecida proclamação "nenhum mito está preenchido com tanta vida". Mas, a partir de agora, pode ser que as resmas de charlatães que andam sempre com o nome do santo Albert no teclado vão procurar cúmplices involuntários para outras paragens.

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