Por Millôr Fernandes
(Com pequenas adaptações minhas)
Existe algo mais libertário do que o conceito do “foda-se!”?
O “foda-se” aumenta a minha auto-estima, torna-me uma pessoa melhor.
Reorganiza as coisas. Liberta-me.
“Não queres fazer?! – Então, foda-se!”
“Queres fazer tudo sozinho? – Então, foda-se!”
O direito ao "foda-se" devia estar consagrado na Constituição.
Os palavrões não nascem por acaso. São recursos extremamente válidos e criativos para dotar o nosso vocabulário de expressões que traduzem com a maior fidelidade os nossos mais fortes e genuínos sentimentos. É o português a fazer a sua língua
“Comó caralho!”, por exemplo. Que expressão traduz melhor a ideia de muita e quantidade que “comó caralho!”? Tende para o infinito, é quase uma expressão matemática.
“Eu gosto do meu clube comó caralho!”
“O sol está quente comó caralho!”
“O gajo é parvo comó caralho!”
E o “nem que te fodas!”?
Expressa a mais absoluta negação.
O “nem que te fodas!” é irretorquível e liquida o assunto.
Quando lhe pedirem dinheiro, mate o assunto:
“Ó meu caro, não te empresto, nem que te fodas!”
Há outros palavrões igualmente clássicos:
Pensa na sonoridade de um “Puta que pariu!”,
ou o seu correlativo “Pu-ta-que-o-pa-riu!”
Diante uma notícia irritante, qualquer “pu-ta-que-o-pariu!”, dito assim, põe-te outra vezes nos eixos.
E o que dizer do nosso famoso “vai levar no cu!”?
E a sua maravilhosa e reforçada derivação “vai levar no olho do cú!”?
Já imaginaste o bem que alguém faz a si próprio e aos seus quando, passado o limite do suportável, se dirige ao canalha do seu interlocutor e solta:
“Chega! Ó meu, vai levar no olho do cu!”?
Pronto, tu retomaste as rédeas da tua vida e da tua auto-estima.
Desabotoas a camisa e sais à rua, vento batendo na face, olhar firme, cabeça erguida, um delicioso sorriso de vitória.
E seria tremendamente injusto não registar aqui a expressão de maior poder de definição do Português Vulgar: “Fodeu-se!”
E a sua derivação, mais avassaladora ainda: “Já se fodeu!”.
Conheces definição mais exacta, pungente e arrasadora para uma situação que atingiu o grau máximo imaginável de ameaçadora complicação.
Quando ouves uma sirene da polícia atrás de ti a mandar-te parar,
o que dizes? “Já me fodi!”.
E quando te apercebes que és de um país em que quase nada funciona; o desemprego não baixa; os impostos são altos; a saúde, a educação e a justiça são de baixa qualidade,
Agora digo eu:
Foda-se! Pu-ta-que-pa-riu este país!
E se alguém - no genérico! - entra no teu bolso:
Já me fodi! Estes gajos roubam comó caralho!
E a algumas pessoas apetece mesmo dizer:
“Vão levar no cu!
Mas não desesperemos!
Portugal ainda vai ser um país do caralho!!!
Só não sei quando…
Luís Castro