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 A Importância do Ultramar para a Economia Nacional 
 
 
 
Tenente‑Coronel PilAv João José Brandão Ferreira* 
 
 
No  número 10 de Outubro de 1999 da Revista Militar, escrevemos com o mesmo  título um artigo em que a matéria exposta cobria o período em que  Portugal se tinha lançado na gesta dos Descobrimentos, até à realização  da Conferência de Berlim em 1884/85. Vamos hoje retomar o tema mas agora  na tentativa de cobrir o período que dista daquela Conferência até ao  golpe de Estado que depôs o regime Corporativo, conhecido por Estado  Novo, em 25 de Abril de 1974. 
 
 
O Século XIX 
 
“O  primeiro passo de uma Nação para aproveitar as suas vantagens é  conhecer perfeitamente as terras que habita, o que em si produzem, o de  que são capazes.” 
Memória Económica 
 
 
A  “directiva” do Marquês de Sá da Bandeira de 1836, ao tentar transferir o  esforço estratégico do Brasil para a África Portuguesa, teve em mente  também, encontrar substituto para os produtos cuja independência daquele  território fizera perder. Do igual modo, visava facilitar o combate ao  tráfico de escravos por parte do governo de Lisboa já que essa medida  iria prejudicar a economia brasileira (muito dependente do trabalho  escravo) e que após 1822, passou a ser concorrente com a portuguesa. 
 
Os interesses das potências europeias e ocidentais1 pelo  Continente Africano, que culminaram na Conferência de Berlim, em  1884/5, veio fazer confluir em África avultados meios humanos,  financeiros e tecnológicos que visavam a exploração daquele vasto, rico,  porém, mal conhecido e explorado Continente. Portugal, não só por  vontade própria, mas também (ou sobretudo), pelas realidades exógenas  que o afectavam, não só para desenvolver o que já era seu, mas outrossim  para o defender e consolidar, teve que acompanhar esta evolução. 
 
 Sem  embargo, a carência de recursos (população, financeiros, tecnológicos,  navais, militares, etc.) limitava todas as acções necessárias. A  conflitualidade política e a falta (endémica) de autoridade do Estado,  eram outro factor – mais gravoso que o primeiro –, que prejudicava as  estratégias que se intentassem desenvolver face às realidades e  necessidades ultramarinas.  
 
A  situação política nacional, só começou a estabilizar no final dos anos  20, do século XX, sobretudo a partir do consulado do Professor Oliveira  Salazar e é a partir de então que se podem começar a dar passos  significativos relativamente à economia ultramarina. 
 
Mas  voltemos à Regeneração e ao Fontismo no sentido de tentar caracterizar  melhor a situação na Metrópole para daí se poder extrapolar para o  Ultramar. 
 
O  desenvolvimento económico e social operado na época de Fontes Pereira  de Melo só foi possível com a estabilidade política trazida com a  Regeneração a partir de 1851, e é influenciada pela onda de liberalismo  que se faz sentir na Europa após as Revoluções do ano de 1848. A  economia mundial era liderada pela Grã‑Bretanha, grande impulsionadora  da I Revolução Industrial e potência que dominava a indústria da  maquinaria a vapor e do ferro. 
 
A  primeira acção de Fontes foi procurar o apaziguamento da sociedade  portuguesa profundamente afectada pelo anterior meio século de  devastação: guerras com a Espanha e França; invasões, guerras civis,  humilhações, intervenções estrangeiras, revoluções e golpes militares,  independência do Brasil, desarticulação quase total da vida económica,  social e financeira, etc. 
 
Para  isso tenta a substituição das políticas comprometidas com o passado e  tornar a actividade política novamente credível. Do mesmo modo se tenta  reabilitar o Estado, pela sua moralização, de modo a que passasse a ser  visto pelo povo como uma “pessoa de bem”. 
 
Tudo  isto servia para retirar legitimidade a eventuais golpismos futuros. De  seguida, Fontes Pereira de Melo tratou das finanças, cujo problema  maior consistia em encontrar verbas para pagar aos credores  estrangeiros, atrair capitais e inspirar confiança. 
 
Como  não havia dinheiro, obrigou‑se, em Dezembro de 1851, à capitalização  dos juros da dívida pública, a que se seguiu, um ano depois, a sua  conversão forçada que passa de 85.000 para 90.000 contos2. 
Os  títulos da dívida portuguesa deixaram de ser cotados no mercado de  Londres e entra‑se em rota de colisão com os credores estrangeiros.  Vence‑se o braço de ferro com estes e chega‑se a um acordo, em 1856, que  permite renegociar o pagamento da dívida pública3. 
 
A partir daqui foi possível começar a financiar as obras de fomento indispensáveis à economia nacional. 
 
No  meio de tudo isto o governo português beneficiou da sorte. Com a  proibição e perseguição do negócio de escravos no Brasil muitos dos  negreiros fugiram para Portugal e trouxeram as suas fortunas, que  investiram4. 
 
Por esta altura, criou‑se o sistema fiscal moderno. 
 
Apesar  de tudo as receitas continuam inferiores às despesas, o que é agravado a  prazo, pelo facto de muitas das medidas terem sido empregues em  actividades não produtivas. O sistema é salvo, a partir de 1871, com a  emigração, sobretudo para o Brasil. É com as remessas destes  trabalhadores que o Estado irá equilibrar as contas da balança de  pagamentos5. A queda destas remessas em 1890 para cerca de um quarto faz cair todo o edifício6. 
 
No  período, o mercado financeiro aumentou enormemente. Em 1863 existiam  quatro bancos que passaram para 15, em 1872 e 51, em 1875, altura em que  começou a dar‑se um processo de concentração. Em 1890 havia em Portugal  45 bancos. Os depósitos bancários acompanharam a evolução. Assim em  1846, existiam 939 contos, o que representava menos de metade do  dinheiro em circulação; em 1875 já somavam 35.099 contos, ou seja 2,5  vezes a circulação fiduciária. Em 1890 ascendia a 47.000 contos, 4,5  vezes aquele valor. O crédito bancário teve uma subida ainda superior. 
 
A  política de obras públicas, sobretudo no sector dos transportes e  comunicações era fundamental para acompanhar o que se passava na Europa e  o enorme desenvolvimento tecnológico e industrial em todo o mundo,  sobretudo no velho continente e nos EUA. O aumento da produtividade e do  número de bens de consumo existentes e a melhoria no seu acesso, tinha  multiplicado o comércio quer interno quer externo, por muitas vezes. De  facto, em 1850, a Europa Ocidental e Central estão já cobertas por uma  rede considerável de estradas, canais e caminhos‑de‑ferro. 
 
De tudo estava Portugal afastado, quando não tinha as suas anteriores estruturas destruídas7.  O instrumento principal do então Chefe do Governo foi a criação do  Ministério das Obras Públicas, Comércio e Indústria, a primeira entidade  criada em Portugal directamente vocacionada para o desenvolvimento  integrado da economia. 
 
A  rede de caminho de ferro a nível nacional, de difícil concepção dadas  as sensibilidades regionais e internacionais (Espanha), que houve que  ultrapassar, ficou constituída em 18908. A França pretendia  ainda conseguir uma via rápida que, de Irun, ligasse aos portos  portugueses nomeadamente Lisboa, de modo a poder exportar os seus  produtos para as Américas, o que naquela altura era considerado mais  económico. 
 
A rede viária foi aumentada significativamente9.  Todo este esforço teve também um efeito muito positivo na criação de  empregos, na concentração de capitais e no alargamento do mercado. 
 
Como  complemento do atrás exposto, instalou‑se o telégrafo que passou a  ligar as cidades e vilas mais importantes e desenvolveram‑se os portos e  os transportes fluviais. Ainda no âmbito do telégrafo, Portugal  beneficiou cedo da amarração do primeiro cabo submarino da Inglaterra,  em Lisboa, seguindo‑se Cabo Verde e Madeira. 
 
A  navegação a vapor desenvolve‑se finalmente e são estabelecidas  carreiras regulares para Angola e S. Tomé. Porém, para Moçambique  falharam, sendo este território servido até ao fim do século por navios  ingleses e alemães. 
 
O mercado nacional torna‑se único e a economia de subsistência sofreu um forte abalo. 
 
Investiu‑se  fortemente na agricultura entre 1850 e 1890, que passou a seu um dos  esteios da economia portuguesa, sem embargo de, neste período, ainda  ocupar cerca de 70% da população activa portuguesa. 
 
A  produtividade aumentou o que para além de permitir um melhor  abastecimento interno, criou excedentes exportáveis. Excepção para o  trigo, de que Portugal se tornou um grande importador em virtude da  concorrência do trigo americano com o qual o trigo nacional não tinha  hipóteses de competir. 
 
Os  principais produtos de exportação foram o vinho, a cortiça, o gado, as  frutas secas, as laranjas e até as amoreiras para alimentar os casulos  do bicho da seda10. Para o fim, a maioria da exportação de cortiça era já trabalhada, devido ao aparecimento de dezenas de pequenas fábricas11. 
 
Vários factores contribuiriam para este surto de desenvolvimento:  
Diminuição  da economia de subsistência; alargamento do mercado para produtos  industriais, fomento da especialização, redução de baldios e pastos  comuns nas regiões do Norte e Centro, cultivo de novas terras, sobretudo  no Sul; redução das propriedades da Igreja e fim dos morgadios com a  venda pública das melhores terras12; generalização do  pagamento de serviços em dinheiro e não em géneros; melhoria do sistema  fiscal; aumento das propriedades e sua modernização; modernização de  alfaias agrícolas e inclusão de adubos, importação das primeiras  máquinas agrícolas em 1860, para o trabalho dos cereais, no Sul. 
 
No  entanto esta “reforma” na estrutura agrícola do País ficou incompleta,  já que o sector capitalista agrário se manteve débil; as exportações  estavam muito condicionadas pela conjuntura do mercado externo, entrando  em colapso facilmente; a zona de maior extensão agrícola, o Alentejo  estava dependente basicamente do trigo e da cortiça, não sendo o  primeiro, competitivo. 
 
As  condições geográficas e climáticas portuguesas tornam a produção  agrícola muito instável e o tipo de produtos tradicionais, requer apenas  uma mão‑de‑obra sazonal, com apenas cerca de dois meses de trabalho  intensivo por ano. Tal facto acarreta que a maioria dos trabalhadores  agrícolas tivesse que subsistir precariamente nas suas pequenas terras e  migrasse conforme as necessidades em mão‑de‑obra dos diferentes  produtos. A aplicação de novas tecnologias ou maquinaria ao arroteamento  e tratamento dos produtos agrícolas portugueses é também difícil13. 
 
A  agricultura de subsistência, obriga à emigração de muitos braços, cujas  remessas monetárias, vão por outro lado permitir que as pequenas  empresas agrícolas sobrevivam, evitando a falência que a sua  improdutividade impunha. 
 
O  comércio interno na época do Fontismo teve um desenvolvimento enorme.  Para além das feiras rurais que se mantiveram, apareceu o intermediário e  uma nova geração de comerciantes que fizeram canalizar grande parte da  produção para as cidades e para os grandes armazenistas. 
 
Como  seria de esperar as zonas que mais se desenvolveram foram aquelas que  melhor acesso tinham aos transportes, nomeadamente ao caminho‑de‑ferro. 
 
As  exportações sofreram, como já se disse, um forte incremento. Assim, em  1848 cifravam‑se em 8.084 contos, passando para 13.716 contos, em 1861;  20.032, em 1870; 29.662, em 1880 e 21.539 contos, em 1890, o que denota  uma crise grave nos mercados exteriores e que ajudou a acabar com o  modelo do Fontismo14. 
 
As  importações cresceram ainda a um ritmo superior e foram respectivamente  para os mesmos anos de 10.731 contos, 24.720, 32.361 e 44.428. Tal  facto desequilibrou ainda mais a balança de pagamentos. 
 
Isto  revela um problema estrutural de base quanto à capacidade produtiva do  País incapaz de acompanhar a modernização da economia e as novas  tecnologias. A devastação havida na primeira metade do século, já  citada, fez também que Portugal falhasse a primeira revolução  industrial. Desde então e até aos nossos dias nunca mais se conseguiu  recuperar verdadeiramente deste atraso. 
 
O  comércio internacional e intercontinental sofreu um incremento notável  com a navegação a vapor e a perda da hegemonia da Inglaterra, com o  aparecimento em força dos EUA a partir de 1865 e da Alemanha, depois de  1870, e ainda com a corrida a África no último quartel do século. Todo  este tráfico trouxe uma pressão concorrencial muito forte sobre os  produtos portugueses15. 
 
Em  1865 a Inglaterra era responsável por 66% das nossas exportações e 49%  das importações. Em 1890 os valores desceram para 28 e 31%,  respectivamente. O mesmo tipo de descida aconteceu com o Brasil. Em  contrapartida surgem novos parceiros comerciais: os EUA, a Alemanha e a  Espanha, no fim da década de 80. 
 
Relativamente  aos nossos territórios ultramarinos, só passam a ter alguma importância  a partir de 1880, com o crescimento dos mercados em Angola e  Moçambique, que absorvem parte dos produtos que não se consegue colocar  noutros lugares16. 
 
Com  a implementação do modelo Fontista, Portugal passou a estar muito mais  dependente do sistema internacional (isto é, passou a ser mais afectado  com todas as suas mudanças), em virtude da abertura ao exterior, da  melhoria dos transportes, dos fluxos financeiros e do aumento dos meios  de comunicação de massas. A acrescentar a isto há a vertente cultural,  no sentido em que as ideias, os hábitos e o conhecimento do que se  passava no exterior nomeadamente nas grandes capitais europeias, exercia  uma influência muito grande sobre a burguesia e a intelectualidade  portuguesa. 
 
Quanto  à indústria o Fontismo pretendeu que a industrialização do País  copiasse o modelo ocidental liberal, fosse competitiva e virada para a  exportação. Pretendia ainda que o motor da indústria fosse a iniciativa  privada e não houvesse entraves à livre circulação de pessoas e  capitais. 
 
Este  tipo de modelo é uma excepção na tradição nacional, e no que se  implementaria a seguir, praticamente até à entrada de Portugal na CEE, e  que era um modelo mais fechado voltado para o consumo interno pouco  competitivo e muito dependente do Estado. 
 
Um  levantamento do parque industrial realizado em 1852, revelou a  existência de 362 fábricas, com mais de 10 empregados cuja força de  trabalho totalizava 16.000 operários e que praticamente não utilizava a  força motriz a vapor. 
 
Era  uma indústria tradicional, pré revolução industrial. Para além disto  existiam uns milhares de ofícios artesanais virados para o mercado  regional e cuja permuta era dificultada pela falta de vias de  comunicação. 
Com o Fontismo esta actividade artesanal entra em recessão, devido ao acesso a produtos vindos de centros de produção maiores17. Estas actividades familiares ajudam a manter de pé a pequena propriedade agrícola. 
 
A  indústria cresce muito modestamente e apesar de, em 1881, haver já  instalados 10.000 HP de potência a vapor (10 vezes mais que em 1850),  tal equivalia à potência de uma única grande fábrica inglesa desse  tempo. Naquele ano já 56% de fábricas portuguesas usavam energia a vapor  e os operários subiram para 90.998 (mas apenas 10% trabalham nas  unidades movidas a vapor). 
 
O  valor de produtos manufacturados aumenta a partir de 1880, mas  resume‑se a meia dúzia de artigos: cortiça em obra, têxteis de algodão,  ourivesaria, sapatos e chapéus. 
 
Arranca também a indústria de conservas de peixe18. 
 
A  indústria pesada continua afastada e a inovação tecnológica chega muito  devagar, mantendo o País com largas dependências exteriores. 
 
As  premissas em que assentou o desenvolvimento do Fontismo acabaram por  ser as mesmas que o impediram de se desenvolver plenamente. Só a partir  de 1892, quando se impõem pautas alfandegárias fortes, tanto na  Metrópole como no Ultramar é que as indústrias portuguesas não  competitivas conseguem encontrar mercado para os seus produtos. 
 
Naturalmente existem condicionantes ao pleno desenvolvimento industrial português e à competitividade dos seus produtos: 
– A periferia do País, que tornava mais caro o transporte dos produtos e a sua colocação noutros mercados; 
– A pequenez do mercado nacional; 
– A pouca dimensão das unidades industriais; 
– A falta de capacidade de modernização tecnológica; 
– Falta de financiamento; 
– Falta de investigação científica; 
– Demora na mudança de mentalidade dos empresários; 
–  A excessiva influência que factores exógenos à vida nacional – e que os  governos portugueses não dominam –, têm na economia nacional. 
 
Todos  estes factores se interligam numa relação causa/efeito que é muito  difícil de modificar e que, para além de consequências económicas e  sociais têm, normalmente consequências políticas.  
 
Entre  1890 e 1893 o modelo do Fontismo esgota‑se. A crise nos mercados  internacionais, para onde não se conseguia exportar, mas mantendo as  necessidades de importação; a quebra nas receitas dos emigrantes, a  crise política originada pelo “ultimatum” e dificuldades em arranjar  crédito, foram‑lhe fatais. 
 
Em  termos económicos, pôs‑se um travão ao liberalismo, impondo‑se um  modelo mais proteccionista, virado para o mercado interno, onde entrava  já o ultramarino. Este sistema iria manter‑se até 1930. 
 
A  instabilidade criada veio trazer de novo, ao fim de 40 anos, a tentação  das intervenções militares e o recurso a governos fortes, quiçá  ditaduras. O regime, no entanto, não se conseguiu reformar e foi ele  próprio que ficou em causa. Em 5 de Outubro de 1910, caía. 
 
O “Império” Português em África19 pode  dizer‑se que começa finalmente com o reconhecimento da independência do  Brasil, em 1825, mas na prática só ganha substância com a “corrida a  África” no final do século XIX. 
 
De  facto, até 1850, a sucessão de catástrofes sociais e políticas,  impediram que qualquer governo se preocupasse com África onde a ocupação  efectiva portuguesa, apesar de centenária, se limitava a algumas zonas  do litoral, havendo uma vastidão do hinterland por conhecer, delimitar e  ocupar. A directiva de Sá da Bandeira, de 1836, visando a substituição  do império brasileiro pelo africano não encontrou, assim, terreno fértil  para medrar, nomeadamente em encontrar recursos para ocupar e  desenvolver a bacia do Congo, entre 1850 e 1870. Deste modo a principal  actividade económica no período é o tráfico de escravos, que é combatido  desde 1807, recebe um golpe mortal em 1850, com a proibição da  escravatura no Brasil e se mantém na clandestinidade, sobretudo em  Moçambique, por mais algumas décadas. 
 
A  estratégia seguinte é definida pelo ministro Andrade Corvo que domina a  política colonial até 1879. Tendo em vista objectivos mais limitados e a  antecipação dos interesses das grandes potências sobre África pretendeu  consolidar a posição portuguesa em Angola e Moçambique. Defende uma  política liberal de investimento estrangeiro e que a economia imperial  deve estar ligada às colónias inglesas do Transval. 
 
Dado  Portugal não ter recursos financeiros para o desenvolvimento tenta que  as grandes obras sejam feitas por empresas mistas de capital  estrangeiro, especialmente inglês e americano. Andrade Corvo chega a  defender que Portugal poderia funcionar como porta de entrada dos EUA na  Europa. A estratégia colhe alguns resultados. Terminam as difíceis  operações militares, a escravatura é ilegalizada, existe afluência de  capitais estrangeiros e desenvolvem‑se algumas grandes plantações. 
 
Projectam‑se,  em seguida, as infra‑estruturas necessárias ao desenvolvimento e ao  avanço para o interior. Moçambique toma a primazia, devido aos seus bons  portos naturais e à rivalidade anglo‑boer, existente desde 1835. 
 
Andrade  Corvo aproveita esta rivalidade para garantir apoios ingleses à nossa  fixação no litoral e ao desenvolvimento dos portos, caminhos‑de‑ferro e  estradas para o interior. 
 
Em  1879 assina‑se o Tratado de Lourenço Marques que é o coroar de toda  esta estratégia. A Inglaterra também ganhava, já que completara o cerco  aos Boers. A posse da cidade de Lourenço Marques (e respectivo porto)  foi mais difícil tendo que se recorrer à arbitragem internacional do  Presidente Francês MacMahon, que foi favorável a Portugal. 
 
A  estratégia foi aplicada também ao Estado da Índia onde se conseguiu  construir o caminho‑de‑ferro de Mormugão (que servia o respectivo Porto e  o interior do território) com capitais ingleses. 
 
Andrade  Corvo perspectivava ainda, a negociação de um acordo com a Inglaterra  para o controle do Rio Congo, antes que outras potências cobiçassem a  zona. 
 
A  queda do governo e o afastamento do ministro impediu a plena  concretização de tudo isto. O “ultimatum” de 1890 e a agitação social e  política que se lhe seguiu coincidiu com uma das piores crises  económicas nacionais. 
 
Acontecimentos  no Brasil fizeram cair as remessas dos emigrantes o que era fundamental  para equilibrar a balança de pagamentos. Ao mesmo tempo a empresa  Baring Brothers, banqueiros tradicionais do governo português, abriu  falência, privando Lisboa de créditos e dificultando as operações no  exterior. 
 
Por  falta de divisas o Banco de Portugal tornou inconvertíveis as notas, em  1891, o que se repercute no mundo económico e financeiro. Aumenta o  deficit do orçamento e a dívida interna e externa. Os governos caiem uns  a seguir aos outros. Em 1893 deixa‑se de pagar os juros e amortizações  da dívida externa. 
 
Esta  situação financeira aflitiva, explica a paragem da acção civilizadora  em África entre 1890 e 94, numa altura em que esta era mais  imprescindível, por via do estabelecido na Conferência de Berlim. 
 
A resposta a esta conjuntura não foi fácil e demorou cerca de dez anos a implementar‑se. 
 
Sabendo‑se  que os mercados de exportação que foram perdidos não eram recuperáveis,  impunha‑se a protecção do mercado nacional, tanto na Metrópole como no  Ultramar. Estabeleceu‑se por isso uma pauta alfandegária, em 1892, de  cariz proteccionista, o “ágio de ouro”, no valor de 20% sobre as  mercadorias importadas. Estas medidas fomentaram a troca comercial entre  a Metrópole e o Ultramar, que havia duplicado entre 1861 e 1891. No fim  do século XIX, este intercâmbio representa 3% de importações da  Metrópole e 10% das suas exportações. À data da proclamação da República  estes valores tinham aumentado respectivamente para 4 e 15%. Em vinte  anos, portanto, a importância do mercado colonial triplicou20. 
 
Moçambique  é o território que necessita de medidas com maior prioridade em virtude  da presença na zona das principais potências europeias e onde existem  equilíbrios instáveis. Por razões financeiras as expedições militares  base da ocupação efectiva, só se efectuam – com assinalável êxito,  aliás, – a partir de 1894. É o Comissário António Enes que salva  Moçambique pela criação de um novo modelo económico. Combinou a  aplicação da pauta de 1892 com um tratamento de privilégio ao capital  estrangeiro a fim de atrair os recursos de que não se dispunha.  Formam‑se companhias magestáticas (Companhia de Moçambique e Companhia  do Niassa), com capitais estrangeiros e com amplos poderes.  Tecnicamente a soberania continuava portuguesa, mas na prática grandes  zonas do território estavam debaixo de influência estrangeira. O modelo  não era bom, mas era o possível. 
 
Estas concessões, passaram a ser controladas pela “lei travão” do governo de Hintze Ribeiro, que vigorou até 190121. 
 
A  construção da linha da Beira é entregue a uma companhia inglesa que,  por contrato, fica com o direito à administração do Porto da Beira por  50 anos. Esta linha entra em funcionamento em Setembro de 1898. 
 
Funda‑se  a Companhia do Niassa disputada por capital francês, alemão e inglês e  que arranca em 1893. Fica autorizada a administrar uma zona no norte por  35 anos, a que corresponde 25% de Moçambique. Antes da Grande Guerra e  por acordo secreto com os ingleses, passam os alemães a controlar esta  companhia. Os alemães, aliás, investem no norte de Moçambique e passam a  dominar o comércio a norte do Zambeze. Tornam‑se nítidos os desígnios  políticos da Alemanha na zona22. A França também dispõe de pequenas empresas como a Boror e a Mandal. 
 
Em  1892, é criada a Companhia da Zambézia com capitais franceses e  alemães, que irá dominar a produção do açúcar, sisal e copra, na  Zambézia. 
 
Este  domínio do capital estrangeiro explica, juntamente com o grande  contrabando existente, as fracas trocas comerciais com a Metrópole que,  em 1901, por exemplo, se cifram por metade das angolanas e são  inferiores às de S. Tomé. 
 
Em  1895 é inaugurado o caminho‑de‑ferro entre Lourenço Marques e Pretória,  mais tarde com
 Fonte: Angola do outro lado do Tempo, post de 27Out2012
 
 
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