via Sopas de Pedra by A. M. Galopim de Carvalho on 3/28/10
A SEDIMENTOLOGIA, como a definiu H. A. Wadell, em 1932, é o estudo científico dos sedimentos, quer dos depositados e litificados, quer dos que se encontram em deposição temporária, quer ainda dos que se mantêm em trânsito. Como disciplina especializada, a Sedimentologia teve início na década de 40 do século passado, afirmando-se como uma das mais importantes das Ciências da Terra, desenvolvendo tecnologias e metodologias adequadas ao estudo das rochas sedimentares, desde a sua génese (sedimentogénese) e eventuais transformações (diagénese), à respectiva localização no espaço e no tempo, em estreita associação com a Paleontologia, a Estratigrafia e a Geocronologia e, ainda, à sua utilização como georrecursos.
"A Sedimentologia justifica-se pelo leque de aplicações práticas em que pode ser envolvida", escreveu, em 2003, o Prof. Soares de Carvalho, da Universidade do Minho. Para nos darmos conta da oportunidade desta afirmação basta pensar no interesse posto na prospecção, exploração e usos industriais dos combustíveis fósseis, dos calcários, das areias e argilas, do sal-gema e, ainda, nas suas aplicações em hidrogeologia, geologia do ambiente, geologia de engenharia e em problemas inerentes ao ordenamento do território.
Sedimentologia é, pois, outra maneira de dizer Petrologia Sedimentar, expressão que se não deve confundir com Petrografia Sedimentar, uma vez que petrografia é o estudo das rochas, visando a sua descrição, identificação e classificação, e petrologia, mais abrangente, é a ciência das rochas, na sua globalidade, incluindo a interpretação dos processos genéticos.
Terrae adquae Solis filiae, expressão latina que quer dizer "as filhas da Terra e do Sol", é uma maneira alegórica de referir as rochas sedimentares. Na mesma alegoria, pode dizer-se que, fecundada pela radiação solar, indutora dos processos geodinâmicos e biológicos próprios da sua capa externa, a mãe Terra dá nascimento às rochas sedimentares, outra categoria das suas criações. As rochas sedimentares trazem consigo não só as marcas dos seus progenitores, mas também as das condições ambientais em que foram geradas e, muitas delas, ainda, a data do seu nascimento.
As rochas sedimentares no seu todo, desde as mais recentes, incoesas e móveis (como as areias) às mais antigas, compactadas e consolidadas, são consequência de um conjunto de condições próprias e originais da superfície do nosso Planeta. São elas: 1) uma atmosfera oxidante (a partir de uma certa altura) e, em grande parte, húmida, particularmente agressiva para os minerais das rochas aflorantes; 2) uma hidrosfera que promove não só a alteração química das rochas, mas também a erosão, o transporte e a deposição dos sedimentos; 3) a distância a que se encontra do Sol, permitindo-lhe o fluxo de energia radiante necessária e suficiente aos processos inerentes à sua formação e que também lhe assegura a Vida nos mais variados ambientes da sua superfície.
Sem atmosfera, hidrosfera e biosfera não se teriam formado os sedimentos e as rochas sedimentares que, por todo o lado, nos rodeiam. Na ausência destas geosferas, a superfície terrestre estaria, à semelhança da Lua, reduzida a uma capa de rególito, isto é, de poeiras e fragmentos rochosos resultantes dos impactes meteoríticos ocorridos ao longo de milhares de milhões de anos. Face a esta realidade, a Sedimentologia não pode deixar de ser entendida como uma disciplina fundamental no âmbito das ciências geológicas.
As rochas sedimentares representam um conjunto particular de produtos naturais gerados na parte mais externa da crosta terrestre e, portanto, nas condições de pressão e temperatura próprias da superfície, ocupando uma posição bem delimitada no ciclo das rochas. Consumindo, sobretudo, energia solar, a sedimentogénese é aceite como uma das expressões da geodinâmica externa, a par da erosão do relevo, da formação dos solos e do aparecimento e manutenção da Vida. Geradas na interface da litosfera com as atmosfera, hidrosfera e biosfera, as rochas sedimentares são essencialmente constituídas por um, dois ou três dos seguintes componentes fundamentais: 1) terrígenos, herdados por via detrítica de outras rochas preexistentes; 2) quimiogénicos, resultantes da precipitação de substâncias dissolvidas nas águas; e 3) biogénicos, quer edificados por alguns organismos em vida, quer acumulados detriticamente a partir de restos esqueléticos, após a morte dos respectivos seres.
Se, em termos de volume, as rochas sedimentares representam apenas 5% do volume da crosta terrestre (contra 95% das rochas ígneas e metamórficas), tal é devido ao conceito implícito no respectivo qualificativo. Porém, tendo em conta que a grande maioria das rochas metamórficas como xistos, metagrauvaques, mármores, quartzitos e outras, são materiais litológicos transformados a partir de rochas sedimentares preexistentes, aquela cifra aumenta substancialmente. Aumenta ainda mais se nos lembrarmos que a maior parte dos granitos e rochas afins resultaram da fusão parcial (anatexia) de rochas sedimentares e metamórficas. Em termos de área exposta, as rochas sedimentares perfazem cerca de 75% das terras emersas e cobrem a maior parte dos fundos marinhos, embora neste domínio a sua espessura seja ínfima, se comparada aos milhares de metros das acumulações integradas na arquitectura da crosta continental, isto é, nos continentes, incluindo as margens continentais submersas.
(In: "Geologia Sedimentar", Volume II, Âncora Editora, 2005)
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