terça-feira, 1 de julho de 2008

George Sorel (II)

via INCONFORMISTA.INFO de Miguel Vaz em 01/07/08
No começo era a acção

Retomando a distinção, já hoje clássica, entre guerra «justa» e guerra «injusta», opõe a violência burguesa à violência proletária. Esta última, possui a seus olhos uma dupla virtude. Não só deve assegurar a revolução futura mas é ainda o único meio de que dispõem as nações europeias, «embrutecidas pelo humanitarismo», para reencontrar a sua antiga energia.
A luta de classes é por um afrontamente de vontades firmes, mas não cegas. A violência torna-se na manifestação de uma vontade. Ao mesmo tempo, exerce uma espécie de função moral: produz um estado de espírito de equipa.
— A violência, declara Sorel ao seu amigo Jean Variot, é uma doutrina intelectual: a vontade de cérebros poderosos que sabem o que querem. A verdadeira violência é o que é necessário para se ir até ao fim das ideias (Propos de George Sorel, Gallimard, 1935).
Sorel teria aprovado estas palavras de Goethe: «No começo era a acção». Para ele, faça o que fizer, o homem que age é sempre superior ao homem que se submete: «A verdadeira violência faz surgir no primeiro plano o orgulho do homem livre».
Para que o mundo actual readquira a sua energia é preciso um «mito», isto é, um tema que não seja nem verdadeiro nem falso, mas que aja poderosamente nos espíritos, mobilize e incite à acção.
George Sorel via na Prússia do último século a herdeira da antiga Roma.
Para cantar as «virtudes prussianas», encontra um tom que não deixa de evocar Moeller Van der Bruck (Der Preussische Stil). «Sorel, o artesão, tem o culto do trabalho bem feito, nota Claude Polin, e o trabalho bem feito deve constituir um fim em si, independentemente dos benefícios que dele se retiram. Este desinteresse é próprio da violência: no fundo do pensamento de Sorel há a intuição de que todo o trabalho é uma luta, em especial o trabalho bem feito e até, de que o trabalho só é bem feito quando é uma luta. Esta ideia retoma a intuição do carácter essencialmente prometeíco do trabalho. Todo o verdadeiro trabalho é uma transformação das coisas que comporta a necessidade de se transformar a si próprio e aos outros consigo».
Pouco a pouco, Sorel acaba por denunciar a democracia (verdadeira ditadura da incapacidade) conjugando o já acentuado por um Maurras, um Bakounine e um Secrétan.
A ditadura do proletariado surge-lhe mais ou menos como um engodo: «É preciso ser-se ingénuo para supor que todas as pessoas que retiram proveito da ditadura demagógica abandonariam facilmente as suas vantagens». De passagem, recusa o papel de vanguarda que o bolchevismo intelectual pretende para si: «Todo o futuro do socialismo reside no desenvolvimento autónomo dos sindicatos operários» (Matériaux pour une Théorie du Prolétariat). «Marx nem sempre foi bem inspirado», prossegue ele. «Nos seus escritos, acontece-lhe introduzir quantidades de velharias provenientes dos utopistas.»
Esta concepção da acção está em completa oposição com as teorias «vanguardistas» (o trotskysmo, por exemplo). Mas encontramo-la nas propostas do sindicalismo revolucionário e do anarco-sindicalismo.
Finalmente, se Sorel defende o proletariado com um tal encarniçamento, não é por sentimentalismo, como Zola, nem pelo gosto pequeno-burguês da culpabilidade, nem mesmo porque o aflige uma «consciência de classe». É por que está convencido que, no seio da sociedade burguesa, só no povo se poderá encontrar a energia que as classes dirigentes perderam. Consciente das «ilusões do progresso», constata que as sociedades, como os homens, são mortais. A esta fatalidade, opõe uma vontade de viver de que a violência é uma das manifestações.
Hoje em dia, Sorel denunciaria tanto a sociedade mercantil como os mestres pensadores da contestação. «Marcuse representaria a seus olhos», escreve Polin, «o exemplo típico do homem degenerado pela crença beatífica do progresso, iludido por um progresso de que nada compreendeu e tudo esperava, incapaz de pôr a sua esperança para além de um progresso exacerbado, radicalizado, nesse sonho de uma abundância, de tal modo automática, que traria em primeiro lugar a felicidade tornando possível a saciedade desordenada das paixões mais loucas, numa palavra, incapaz de compreender que a fonte do mal está no homem, desvirilizado pela fé económica».

Alain de Benoist
in "Nova Direita Nova Cultura – Antologia crítica das ideias contemporâneas", Lisboa, Fernando Ribeiro de Mello/Edições Afrodite, 1981.

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